Fordlândia: Ascensão e queda da cidade esquecida de Henry Ford na selva, de Greg Grandin, é uma fascinante obra que narra a ambiciosa e desa...
Fordlândia: Ascensão e queda da cidade esquecida de Henry Ford na selva, de Greg Grandin, é uma fascinante obra que narra a ambiciosa e desastrosa tentativa de Henry Ford de criar uma cidade industrial americana no coração da Amazônia brasileira.
Henry Ford revolucionou a produção industrial e o próprio capitalismo ao desenvolver o conceito de linha de montagem ao fabricar os seus automóveis. Sua visão empreendedora tornou seus carros acessíveis a grande parte da população, que antes eram artigos de luxo relegados a uma elite com muitos recursos financeiros.
Fonte: Livro Fordlândia. Ascensão e Queda da Cidade Esquecida de Henry Ford na Selva.
Visto no Brasil Acadêmico
Devido ao sucesso de seus empreendimentos ocorreu a Ford que ele teria a receita para fazer a sociedade perfeita. Uma versão melhorada, na visão do magnata, da sociedade americana que para ele estaria decadente moralmente e caminhando na direção errada.
Assim, com sua administração verticalizada, pensou em produzir, ele mesmo, a borracha dos pneus de seus carros. Para isso, adquiriu às margens do Rio Tapajós uma extensa área para plantar serigueiras e começar ali a extração em escala industrial do látex.
Para tanto, não mediu esfoços e investimento de dinheiro na chamada Fordlândia. Uma cidade de trabalhadores onde iria levar desenvolvimento e os valores norteamericanos para o coração da densa floresta. Partindo do zero. Sem nem mesmo consultar outras multinacionais que já havia experimentado explorar países tropicais como Cuba e outros da América Central – No auge do boom da banana nos anos 1920, podia-se percorrer Guatemala, Costa Rica, Panamá, Honduras, Cuba e Colômbia sem deixar por um momento propriedades da United Fruit Company. E deu muito errado.
Henry Ford, em sua busca por simplificar o processo de produção, dividiu a fabricação de um carro Ford em 7.883 tarefas distintas, adequando-as às capacidades físicas e mentais dos trabalhadores. Ele determinou que 949 dessas tarefas exigiam “homens em boa forma e condições físicas praticamente perfeitas”, enquanto 670 poderiam ser realizadas por “homens sem pernas”, 2.637 por “homens com apenas uma perna”, 2 por “homens sem braços”, 715 por “homens com apenas um braço” e 10 por “cegos”. As tarefas restantes demandavam trabalhadores saudáveis, com “desenvolvimento físico e mental comuns”.
Em 1913, esse modelo de produção reduziu o tempo necessário para fabricar um Modelo T de doze horas e oito minutos para apenas uma hora e trinta e três minutos. No entanto, enquanto a produção industrial era otimizada, os mistérios da Amazônia permaneciam complexos e pouco compreendidos. Mesmo após séculos de estudos, os cientistas ainda não conseguem explicar por que a floresta amazônica se mantinha verde durante a estação seca, ao contrário de outras florestas, ou como esse comportamento único de fotossíntese contribui para a distribuição sazonal de água na região.
A interferência da Ford na floresta demonstrou o impacto imprevisível das intervenções humanas. O desmatamento para o plantio de seringueiras removeu a camada de folhas que protegia riachos, aumentando a incidência de luz solar e favorecendo o crescimento de algas. Como consequência, houve um aumento da população de lesmas, vetores de um verme parasita que causa esquistossomose — uma doença que afeta a bexiga e o cólon humano, e que não existia na Amazônia brasileira até se manifestar na Fordlândia.
1️⃣ A Visão Utópica de Henry Ford
Em 1927, Ford adquiriu 1 milhão de hectares na Amazônia para plantar seringueiras, buscando escapar da dependência do mercado asiático uma vez que a Ford Motor Company precisava da borracha para os pneus de seus veículos. Ele planejou uma cidade-modelo com escolas, hospitais, cinemas e moradias inspiradas no estilo americano. O objetivo? Levar “progresso” e “modernidade” à selva.
Em 1928, a Ford iniciou um incêndio de grandes dimensões para abrir terreno para uma plantação de seringueiras no Pará. Foi o prenúncio de uma época de exploração brutal da região – e também o início de um sonho: nascia ali a Fordlândia, uma cidade americana, com automóveis, geladeiras e um campo de golfe, em meio à selvagem floresta amazônica. A história desse sonho e do homem que ousou torná-lo realidade que é contada em detalhes nessa obra de Greg Grandin. Depois, foi tudo transferido para cerca de 100 quilômetros dali, em Belterra.
“O que as pessoas do interior do Brasil precisam é de estabilidade econômica e de padrões modernos de vida.”
2️⃣ Choque Cultural
Os trabalhadores locais enfrentaram dificuldades para se adaptar às regras rígidas e ao estilo de vida imposto. A disciplina da linha de montagem não fazia sentido para uma população acostumada a um ritmo de trabalho sazonal.
“Eles abandonavam o trabalho assim que juntavam o suficiente para viver por alguns meses.”
Assim, os administradores da Ford se encontravam em um dilema peculiar: Deveriam oferecer um salário maior que o salário médio local, algo difícil de ser determinado, mas não poderia ser alto a ponto de logo o trabalhador se sentir satistfeito e abandonar a empresa a fim de cuidar de sua cultura de subsistência.
3️⃣ Conflitos e Revoltas
Regras como a proibição de álcool, horários rigorosos e comida inadequada geraram revoltas. Uma das mais emblemáticas foi a “Revolta do Rancho”, quando os trabalhadores destruíram o refeitório em protesto contra a qualidade da comida.
“Os trabalhadores estavam insatisfeitos não apenas com a comida, mas com a tentativa de controle sobre suas vidas.”
4️⃣ A Natureza Implacável
As seringueiras não se adaptaram às condições tropicais, sendo dizimadas por pragas. A selva mostrou sua força, frustrando os planos de Ford.
Henry Ford tratava máquinas como “seres vivos”; assim, esperava-se que seus homens na Amazônia tratassem seres vivos – as seringueiras – como máquinas. O modelo naturalmente era uma fábrica da Ford, Highland Park ou Rouge, com suas fileiras cerradas de máquinas, que reduziam o desperdício de movimentos.
“A floresta amazônica não seria domada como as linhas de montagem em Michigan.”
Esforçou-se para usar o mesmo tipo de controle aplicado à fábrica por Ford à plantação, espaçando pouco as árvores e insistindo que, com a devida disciplina, dois homens poderiam plantar entre 160 e 200 árvores em oito horas, ou 2,5 a 3 minutos por muda. Mas logo perceberam haver problemas no processo, uma vez que o ritmo de plantação das seringueiras estava sujeito a condições menos gerenciáveis – especialmente o mau tempo – do que o ritmo de uma linha de montagem. Há uma razão pela qual as seringueiras na Amazônia não são plantadas muito próximas, elas crescem silvestres, espalhadas entre outras árvores.
A Hevea é nativa das Américas, o que significa que seus predadores naturais, incluindo seu inimigo mais mortal, a praga das folhas sul-americana, também são nativos da região. Assim, na Amazônia as seringueiras crescem melhor quando estão relativamente afastadas, umas duas ou três para cada 4 mil m², reduzindo a propagação dos fungos e insetos que se alimentam de suas folhas. Em contrapartida, no sudeste da Ásia, livre da presença desses predadores nativos, elas podem ser plantadas em fileiras cerradas, aos milhares por hectare.
5️⃣ O Fim do Sonho
Em 1945, a Ford Motor Company abandonou Fordlândia, transferindo o controle para o governo brasileiro. O local tornou-se uma cidade fantasma, um monumento ao fracasso de impor uma visão estrangeira a um ambiente e uma cultura tão distintos.
O conselho de administração da Ford Motor Company nomeou Henry Ford II presidente em 21 de setembro de 1945. Em 5 de novembro, vendeu Fordlândia e Belterra, avaliadas em quase US$ 8 milhões e com US$ 20 milhões nelas investidos ao longo de duas décadas, ao governo brasileiro por US$ 244.200 - valor que cobria o que a empresa devia aos seus trabalhadores pelas leis de Vargas, que garantiam o pagamento de indenizações.
“Ford queria levar civilização à Amazônia, mas encontrou resistência tanto da natureza quanto das pessoas.”
O autor Greg Grandin é professor associado de história na Universidade de Nova York, e Fordlândia é seu quarto livro dedicado à América Latina. Participou da Comissão da Verdade da Organização das Nações Unidas, que investigou a guerra civil na Guatemala, tema de seu livro The Blood of Guatemala. Escreve artigos para jornais como The Nations e The New York Times.
🔎 Reflexões do Livro
Colonialismo Cultural: A imposição de um modelo americano revelou a desconexão entre a visão de progresso de Ford e as realidades locais.
Impacto Ambiental: O projeto destacou os limites da industrialização em ecossistemas complexos.
Legado Histórico: Fordlândia permanece como um símbolo das tensões entre modernidade, globalização e tradições locais.
📖 Se você é fascinado por histórias de ambição, fracasso e as lições da interação entre culturas, “Fordlândia” é uma leitura imperdível! 🌍✨
💬 E você? Já conhecia essa história?
Fonte: Livro Fordlândia. Ascensão e Queda da Cidade Esquecida de Henry Ford na Selva.
Visto no Brasil Acadêmico
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