Moleza imensa, quase inércia, tomando conta de mim. Como se fosse o último repouso no leito derradeiro.. Dormir, dormir e, de repente, acord...
Moleza imensa, quase inércia, tomando conta de mim. Como se fosse o último repouso no leito derradeiro.. Dormir, dormir e, de repente, acordar lúcido; se não totalmente aceso, ao menos com uma lucidez morna de quem percebe, ouve, fala, mas convalesce pela astenia e sonolência.
Até de um certo humor e querendo vida. Pode ser que se dissesse que isso não seja vida. Mas, vida é o que não é morte. Morte é o nada, incerteza, a escuridão tão profunda que até o pensamento mergulha na negritude desse nada.
Morte é um abismo sem fundo e sem volta. É um cair incessante sem vento no rosto, sem luz, sem esperança alguma; de solidão nunca sentida. No mergulho da morte não há mão estendida, não há ontem, nem agora, nem tempo algum. Não há amparo nem destino, nem lugar onde chegar. Não é um final puntiforme. Morte é uma findar contínuo e para sempre. É um buraco negro que nos engole para nunca mais escaparmos. A morte é um findar sem fim. É um fim que não se escreve com três letras apenas; é um infinito e interminável fim.
A morte apavora, não por causa de meu medo, mas pelo pavor que encerra em si mesma.
Não me olhem assim os, que a beira de meu leito, suportam essa arrastada despedida.
Como se eu não percebesse seu sofrer.
Quero vida porque é a minha única certeza. A vida que quero não afeta ninguém. Não pretendo amealhar pedacinhos de vida de ninguém. Quero apenas a vida que já é minha, que o Senhor já me concedeu. Deixando, eu de vivê-la, a ninguém tocará qualquer porção do que me resta viver. Nenhum pedacinho de minha vida será acrescido a qualquer outra vida. Por exígua que seja, enquanto através dela eu me perceber, eu a quero em mim.
Quero um viver simplesinho, quase imperceptível, de modo a não incomodar. Beber água doce tão aos pouquinhos que não diminua em nada o manancial do mundo, respirar o ar tão parcimoniosamente que bastem as roseiras de meu jardim para purificar e devolver á atmosfera o tanto que respirei; comer pouco e vagarosamente o que me toca. Quero ter vida apenas o suficiente para perceber o viver os sorrisos, as expressões das faces, as pessoas, as coisas. O mundo ao meu redor, os barulhos das gentes, das coisas, dos seres da natureza.
A vida é um conjunto imenso de sinais de vida.
Sorrisos, choros, vozes, tosses, espirros, suspiros, cantos de pássaros, barulhos caseiros como de um prato que cai e se parte em pedaços, de gente chegando da rua, de um cão que ladra, um gato que mia, uma criança chamando a mãe, uma porta que bate, uma música no rádio; alguém contando segredo sussurrando. Uma nesga de luz que entra numa fresta de janela. A vida é uma riqueza infinita de pormenores cuja energia nos é propiciada gratuitamente pelo universo através do sol. Só, que para que se sinta a vida, nossa única certeza, é preciso ter vida dentro de si. Ainda que seja só um tantinho de vida. Uma sobrevivência lúcida. Um fulgor. Um brilho no olhar. Um restinho de capacidade de sentir a vida.
Desejo ainda continuar sentindo a bondade humana, o amor das pessoas que amo, o afeto que me cerca. Quero, no último lampejo de meu derradeiro olhar, na última lucidez de minha mente, perceber amor e complacência carinhosa de quem espero amor e ternura; das pessoas que eu amo.
No entanto,
Quando não houver mais lucidez em mim; quando só artifícios humanos estiverem me mantendo, talvez a sobrevivência já não seja vida e, se for irreversível é porque a vida já me abandona, a imensidão secreta e sombria da morte já se assenhora de mim e minha derradeira esperança estará na existência desse Criador Incriado: Deus!...
Então, como um grande ato de amor de todos nós, deixem que eu vá. Com as bênçãos de Deus.
Rilmar - 03/3/2020
Visto no [Brasil Acadêmico]
Até de um certo humor e querendo vida. Pode ser que se dissesse que isso não seja vida. Mas, vida é o que não é morte. Morte é o nada, incerteza, a escuridão tão profunda que até o pensamento mergulha na negritude desse nada.
Morte é um abismo sem fundo e sem volta. É um cair incessante sem vento no rosto, sem luz, sem esperança alguma; de solidão nunca sentida. No mergulho da morte não há mão estendida, não há ontem, nem agora, nem tempo algum. Não há amparo nem destino, nem lugar onde chegar. Não é um final puntiforme. Morte é uma findar contínuo e para sempre. É um buraco negro que nos engole para nunca mais escaparmos. A morte é um findar sem fim. É um fim que não se escreve com três letras apenas; é um infinito e interminável fim.
A morte apavora, não por causa de meu medo, mas pelo pavor que encerra em si mesma.
Não me olhem assim os, que a beira de meu leito, suportam essa arrastada despedida.
Como se eu não percebesse seu sofrer.
Quero vida porque é a minha única certeza. A vida que quero não afeta ninguém. Não pretendo amealhar pedacinhos de vida de ninguém. Quero apenas a vida que já é minha, que o Senhor já me concedeu. Deixando, eu de vivê-la, a ninguém tocará qualquer porção do que me resta viver. Nenhum pedacinho de minha vida será acrescido a qualquer outra vida. Por exígua que seja, enquanto através dela eu me perceber, eu a quero em mim.
Quero um viver simplesinho, quase imperceptível, de modo a não incomodar. Beber água doce tão aos pouquinhos que não diminua em nada o manancial do mundo, respirar o ar tão parcimoniosamente que bastem as roseiras de meu jardim para purificar e devolver á atmosfera o tanto que respirei; comer pouco e vagarosamente o que me toca. Quero ter vida apenas o suficiente para perceber o viver os sorrisos, as expressões das faces, as pessoas, as coisas. O mundo ao meu redor, os barulhos das gentes, das coisas, dos seres da natureza.
A vida é um conjunto imenso de sinais de vida.
Sorrisos, choros, vozes, tosses, espirros, suspiros, cantos de pássaros, barulhos caseiros como de um prato que cai e se parte em pedaços, de gente chegando da rua, de um cão que ladra, um gato que mia, uma criança chamando a mãe, uma porta que bate, uma música no rádio; alguém contando segredo sussurrando. Uma nesga de luz que entra numa fresta de janela. A vida é uma riqueza infinita de pormenores cuja energia nos é propiciada gratuitamente pelo universo através do sol. Só, que para que se sinta a vida, nossa única certeza, é preciso ter vida dentro de si. Ainda que seja só um tantinho de vida. Uma sobrevivência lúcida. Um fulgor. Um brilho no olhar. Um restinho de capacidade de sentir a vida.
Desejo ainda continuar sentindo a bondade humana, o amor das pessoas que amo, o afeto que me cerca. Quero, no último lampejo de meu derradeiro olhar, na última lucidez de minha mente, perceber amor e complacência carinhosa de quem espero amor e ternura; das pessoas que eu amo.
No entanto,
Quando não houver mais lucidez em mim; quando só artifícios humanos estiverem me mantendo, talvez a sobrevivência já não seja vida e, se for irreversível é porque a vida já me abandona, a imensidão secreta e sombria da morte já se assenhora de mim e minha derradeira esperança estará na existência desse Criador Incriado: Deus!...
Então, como um grande ato de amor de todos nós, deixem que eu vá. Com as bênçãos de Deus.
Rilmar - 03/3/2020
Visto no [Brasil Acadêmico]
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