Produtos químicos capazes de desregular os hormônios estão dizimando a fertilidade em um ritmo alarmante em todo o mundo. J á falamos sobr...
Produtos químicos capazes de desregular os hormônios estão dizimando a fertilidade em um ritmo alarmante em todo o mundo.
Já falamos sobre o trabalho da Drª Shanna Swan em 2009 (em Plásticos podem afeminar meninos). Agora, essa influente epidemiologista ambiental e reprodutiva da Icahn School of Medicine at Mount Sinai, em Nova York, lançou recentemente o livro (Count Down: How Our Modern World Is Threatening Sperm Counts, Altering Male and Female Reproductive Development, and Imperiling the Future of the Human Race, sem tradução em português) que já se tornou um best seller nas categorias Fertilidade e Desenvolvimento Biológico e certamente não é por seu estilo literário.
Fonte: The Guardian, The Intercept
Visto no Brasil Acadêmico
Na obra, Swan alerta ter descoberto que a contagem de espermatozoides caiu quase 60% desde 1973. E se for projetado esse ritmo acentuado de queda, a pesquisa de Swan sugere que a contagem de espermatozoides pode chegar a zero em 2045.
“Zero. Deixe isso internalizar. Isso significaria nada de bebês. Sem reprodução. Não há mais humanos. Perdoe-me por perguntar: por que a ONU não está convocando uma reunião de emergência sobre isso agora?”Erin Brockovich. Ativista ambiental
Erin Brockovich (a ativista ambiental retratada no filme Erin Brockovich - Uma Mulher de Talento, de 2000), em artigo no The Guardian, chama a atenção para os produtos químicos responsáveis por esta crise e sua onipresença.
“Estão em tudo, desde recipientes de plástico e embalagens de alimentos, a roupas à prova d'água e fragrâncias em produtos de limpeza, a sabonetes e xampus, a eletrônicos e carpetes. Alguns deles, chamados PFAS, são conhecidos como 'produtos químicos eternos', porque não se degradam no meio ambiente ou no corpo humano. Eles apenas se acumulam e se acumulam - causando mais e mais danos, minuto a minuto, hora a hora, dia a dia.”
O livro de Swan é surpreendente em suas descobertas.
“Em algumas partes do mundo, a mulher média de vinte e poucos anos hoje é menos fértil do que sua avó era aos 35.”
Shawn Swan apud Erin Brockovich
Além disso, Swan descobre que, em média, um homem hoje terá metade do esperma que seu avô tinha. “O estado atual dos assuntos reprodutivos não pode continuar por muito mais tempo sem ameaçar a sobrevivência humana”, escreve Swan, acrescentando: “É uma crise existencial global.”
Como se não fosse aterrorizante o suficiente, a pesquisa de Swan descobriu que esses produtos químicos não estão apenas reduzindo drasticamente a qualidade do sêmen, eles também estão diminuindo o tamanho do pênis e o volume dos testículos, além de trazer altas taxas de disfunção erétil, conforme ressaltou reportagem no The Intercept. Trecho de entrevista à Drª reproduzimos abaixo:
The Intercept: Houve muita cobertura da mídia quando o estudo do esperma foi lançado. Isso desencadeou alguma mudança de política ou ações substantivas em torno da exposição a produtos químicos?
Drª Swan: Não, não houve. Falar em reuniões científicas e escrever artigos científicos também não funcionou. Então, talvez o livro ajude.
The Intercept: Como você começou a estudar produtos químicos e reprodução?
Drª Swan: Tudo começou com a síndrome do ftalato.
The Intercept: Essa foi a descoberta de que ratos fetais expostos a ftalatos 18 a 21 dias após o acasalamento tinham maior probabilidade de nascer com órgãos genitais malformados, mas aqueles que foram expostos a esses produtos químicos desreguladores endócrinos antes ou depois dessa janela não tiveram o problema, certo?
Drª Swan: Certo. Em 2000, um colega dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças me disse que eles eram capazes de medir muitos produtos químicos, incluindo ftalatos, em doses baixas por um custo baixo para muitas pessoas. Este foi um avanço no campo. E eu tinha acabado de fazer um estudo com mães de bebês, e ainda tinha a urina das mulheres grávidas, e os bebês eram muito pequenos. Ele disse que eu deveria estudar ftalatos. Então pensei, OK, e se eu imitar o estudo em animais e procurar os mesmos parâmetros que eles encontraram em ratos? E se eu pudesse ver aqueles em humanos e associá-los aos ftalatos?
The Intercept: E você fez isso?
Drª Swan: Eu fiz. Nós encontramos a síndrome em seres humanos.
The Intercept: Seu estudo mostrou que meninos que foram expostos a quatro ftalatos diferentes no final do primeiro trimestre no útero tinham uma distância anogenital mais curta, ou AGD. Você pode explicar o que é AGD e por que é importante?
Drª Swan: Ninguém vai gostar desse termo, então você pode usar taint ou gooch . Mas basicamente é a distância entre o ânus e o início dos genitais. E os cientistas há muito tempo reconhecem sua importância. Tenho um artigo de 1912 que examina os AGD e mostrou que eles eram quase 100% mais longos nos homens do que nas mulheres. Nosso trabalho mostrou que os produtos químicos, incluindo o dietilhexil ftalato, encurtam o AGD nos homens.
The Intercept: Você também relacionou a exposição ao ftalato à falta de interesse por sexo.
Drª Swan: Sim, encontramos uma relação entre os níveis de ftalato das mulheres e sua satisfação sexual. E pesquisadores na China descobriram que trabalhadores com níveis mais altos de bisfenol A, comumente conhecido como BPA, no sangue eram mais propensos a ter problemas sexuais, incluindo diminuição do desejo.
The Intercept: É claro que os ftalatos, que são adicionados a plásticos, alimentos, cosméticos e outros produtos, não são o único problema. Você escreve sobre muitos produtos químicos que interferem no sistema hormonal e na reprodução, incluindo o pesticida atrazina , que você associou a uma qualidade inferior do esperma, e o glifosato , que recentemente demonstrou diminuir a AGD em ratos e talvez também em humanos. Vale ressaltar que todos esses produtos químicos de que estamos falando ainda estão em uso nos EUA, enquanto alguns outros países os proibiram. De qualquer forma, me fale sobre a relação entre os desreguladores endócrinos e como as crianças brincam?
Drª Swan: Brincadeiras sexualmente dimórficas são controversas. Algumas pessoas dizem que tudo é determinado socialmente. E sem dúvida tem determinantes sociais, mas também tem determinantes fisiológicos. E mostramos isso em dois estudos. Pedimos às mães de crianças pequenas que nos contassem como seus filhos brincam. É muito simples: com que frequência eles brincam com armas? Brincam com bonecas? Brincam de vestir-se? Brincam com jogos de chá, etc. E acontece que quando os meninos são expostos aos mesmos produtos químicos que afetam a AGD, eles brincam de uma maneira menos masculina.
The Intercept: Os produtos químicos também podem mudar a maneira como meninos e meninas aprendem a falar?
Drª Swan: Uma das partes do cérebro que é sexualmente dimórfica tem a ver com a aquisição da linguagem, e as mulheres normalmente estão em vantagem. Quando você pergunta à mãe de uma criança quantas palavras seu filho entende, as meninas geralmente têm muito mais palavras. Mas essa diferença de sexo é diminuída pelos ftalatos. E esse é um tema predominante: Se você olhar para AGD ou comportamento lúdico ou aquisição de linguagem, esses produtos químicos diminuem as diferenças sexuais.
Nos EUA, um estudo científico publicado no periódico Pediatrics, descobriu que a exposição ao ftalato está “disseminada” em bebês e que os produtos químicos foram encontrados na urina de bebês que entraram em contato com xampus, loções e talcos para bebês. Ainda assim, falta uma regulamentação rigorosa, principalmente por causa do lobby de gigantes da indústria química.
No estado de Washington, legisladores conseguiram aprovar a Lei de Prevenção da Poluição para Nosso Futuro, que “direciona as agências estaduais a abordar classes de produtos químicos e se distanciar de uma abordagem de químico por químico, o que historicamente resultou em empresas mudando para igualmente ruim ou pior substitutos. As primeiras classes químicas a serem abordadas em produtos incluem ftalatos, PFAS, PCBs, etoxilato de alquifenol e compostos de bisfenol e retardadores de chama de organohalogênio”. O estado tomou medidas importantes para lidar com a extensão da poluição química, mas, em geral, os EUA, como muitos outros países, estão lutando uma batalha perdida por causa de uma legislação fraca e inadequada.
Hoje, nos EUA, por exemplo, você não pode comer a carne de cervo capturada em Oscoda, Michigan, já que o departamento de saúde de lá emitiu um aviso “não coma” para cervos capturados perto da antiga base da força aérea por causa da alta Níveis de PFAS no músculo de um cervo.
Nenhum país ou região do planeta é intocado pela contaminação de PFAS. É um problema global. O PFAS foi encontrado em todos os cantos do globo. Ele está virtualmente presente no corpo de cada ser humano. É encontrado em peixes no fundo do mar e em pássaros. Por isso, urge que seja encarado com um maior sentido de urgência.
Fonte: The Guardian, The Intercept
Visto no Brasil Acadêmico
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