Comunidade é um conceito polissêmico que vem sendo, historicamente, objeto de estudo de teóricos das mais variadas áreas do conhecimento. Nã...
Comunidade é um conceito polissêmico que vem sendo, historicamente, objeto de estudo de teóricos das mais variadas áreas do conhecimento. Não vamos , nesse espaço, esgotar os inúmeros significados do termo. Ao contrário, iremos adotar um senso que sintetize o aspecto que mais interessa ao nosso estudo.
[Via BBA]
Para Koenig (1967 apud SCHLEMMER) , comunidade é “um grupo de pessoas que ocupa um território definido, com o qual se identificam, e em que há um determinado grau de solidariedade”.
Peruzzo (2002 apud SCHLEMMER) relata que diferentes autores clássicos apresentam característas básicas, necessárias a uma comunidade. Entre as quais destacamos:
- localidade, no sentido geográfico, incluindo as comunidades nômades que em algum momento, mesmo que temporariamente, habitam o mesmo território;
- vida em comum por meio de relacionamento e interação intensos entre seus membros;
- objetivos comuns;
- linguagem comum;
- cultura comum;
- sentimento de pertencimento, de comunidade, a partir da coesão social, da coparticipação.
Merriam e Caffarella (1999 apud VIEIRA) diversos pontos de vista sobre o processo de aprendizagem, agrupando-os em cinco orientações básicas: a behaviorista, a cognitivista, a humanista, a do aprendizado social e a construtivista. Para Merriam e Caffarella (1999, p. 249 apud VIEIRA), "embora o aprendizado tenha sido definido numa variedade de formas, a maioria das definições inclui os conceitos de mudança comportamental e experiência. Uma definição comum dos psicólogos, especialmente aqueles que estavam investigando o fenômeno até os anos 50, é que o aprendizado é uma mudança de comportamento. [sem grifos no original]"
A aprendizagem sob a perspectiva do aprendizado social dá-se por meio das interações dos indivíduos. Esta perspectiva, para Merriam e Caffarella (1999, p. 259 apud VIEIRA), “combina elementos tanto da orientação behaviorista como da cognitivista e apresenta uma posição de que as pessoas aprendem observando as outras”. Deste modo, um determinado grupo, formado por pessoas de background diferenciados, tende a um desenvolvimento de seus conhecimentos, uma vez que uma pessoa irá aprender com as outras, através da observação. Este aprendizado baseado na observação é comum entre os artesãos, passando de pai para filho a maneira de construir um determinado objeto, ou em empresas, onde o expertise transfere suas experiências para os novatos que o acompanha durante a realização de determinadas atividades.
Um tipo de comunidade que interessa bastante a quem lida com as formas de aprendizado, em especial dentro de organizações, é a comunidade de prática. Trata-se de uma comunidade de pessoas que partilham formas de trabalhar juntas, experiências, instrumentos e práticas, e acreditam que a aprendizagem compartilhada é um valor a ser preservado.
Uma comunidade de prática não é apenas uma comunidade de interesse, como seria uma comunidade de pessoas que apreciam determinados tipos de música. Seus componentes são antes de tudo praticantes. Eles desenvolvem um repertório compartilhado de recursos: experiências, histórias, instrumentos, modos de enfrentar problemas recorrentes. Essa prática compartilhada pode ser mais ou menos autoconsciente. Por exemplo, os enfermeiros que se reúnem para almoçar no refeitório do hospital podem nem perceber que suas discussões enquanto comem são uma das principais fontes de conhecimento sobre como cuidar de pacientes.
Veja um exemplo dos resultados que podemos obter com esse tipo de relacionamento em: O que os médicos podem aprender uns com os outros (http://blog.brasilacademico. com/2013/11/o-que-os-medicos- podem-aprender-uns-com.htm)
No final do século XX, com o advento da internet, surge o conceito de “comunidades virtuais” (CVs). Essas comunidades são constituídas por pessoas que compartilham os mesmo interesses e objetivos e se relacionam virtualmente por meio de diversas tecnologias digitais, onde o sentimento de pertencimento se desloca do espaço físico para o espaço digital virtual.
Rheingold (1996) foi um dos primeiros autores a, efetivamente, utilizar o termo “comunidade virtual” para os grupos humanos que mantinham relações sociais no ciberespaço. Este as definiu como ”agregados sociais surgidos na Rede, quando os intervenientes de um debate o levam por diante em número e sentimento suficientes para formarem teias de relações pessoais no ciberespaço” (RHEINGOLD, 1996, p.18 apud LOPES).
Nesse contexto, uma comunidade virtual de prática tem como principal objetivo trocar informações, produzir e compartilhar conhecimento, principalmente vinculado à prática profissional. Ela é, antes de tudo, espontânea, e o compartilhamento das práticas se dá através de meios tecnológico, tais como: fóruns, wikis, blogs, chats, entre outros.
Comunidade Virtual de Aprendizagem (CVA)
Palloff e Pratt (2004) abordam outro tipo especial de comunidade on line: as comunidades de aprendizagem. Segundo os autores, o que as difere das demais comunidades on line é envolvimento com a aprendizagem colaborativa e prática reflexiva implícita na aprendizagem transformadora.
Chamada de “comunidade virtual de aprendizagem” (CVA), ela pode ser entendida como um grupo de pessoas que, por meio da telepresença e de presença digital virtual, agem e interagem, compartilhando interesses comuns de aprendizagem.
Essa aprendizagem é uma aprendizagem construtivista, autodirigida, baseada na colaboração e na auto-organização, contando para isso com a participação ativa de todos os participantes.
O aprendizado ocorre mesmo à parte de programas e estruturas formais com esse objetivo. Mesmo em listas de discussão que não possua corpo formal de objetivos a alcançar, ou em interações exclusivamente sociais em comunidades virtuais, ocorre uma espécie de aprendizado contínuo e de grande valia, que atinge os participantes de maneira heterogênea.
Comunidade Virtual de Prática e Aprendizagem (CVPA)
Ambos os conceitos de CVA e CVP são intimamente ligados, sendo difíceis, segundo Moretti (2010), analisá-los separadamente, uma vez que contextos de trabalho tornam-se espaço de aprendizagem.
Alguns teóricos argumentam que as CVAs teriam mais ênfease na individualidade, pois os membros buscam objetivos pessoais vinculados a conteúdos específicos de aprendizados, de modo que a identidade da comunidade e o nível participativo dos membros dependam da capacidade de cada membro de alcançar seus objetivos pessoais.
O quadro 1 permite observar essas e outras diferenças apontadas pelos estudiosos entre os “tipos” de comunidades (no escopo desse artigo, o termo “comunidade de prática distribuída” está sendo considerada como sinônimo de CVP).
Quadro 1 - Diferenças entre as CVAs e comunidades de práticas distribuídas.
Comunidade virtuais de aprendizagem
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Comunidade de prática distribuída
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Membros menos estáveis
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Participação razoavelmente estável
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Baixo grau de conscientização individual
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Alto grau de conscientização individual
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Objetivos de aprendizagem mais formalizados e mais focados
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Objetivos de aprendizagem informal
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Maior diversidade de linguagem
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Linguagem comum
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Baixo entendimento compartilhado
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Alto entendimento compartilhado
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Forte senso de identidade
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Vago senso de identidade
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Estrita distribuição de responsabilidades
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Distribuição de responsabilidades não formal
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Facilmente dissolvida
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Menos facilmente dissolvida
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Baixo nível de confiança
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Razoável nível de confiança
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Tempo de vida determinado pelo grau em que objetivos ou requisitos são satisfeitos
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Tempo de vida determinado pelo valor que a comunidade fornece aos seus membros
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Iniciativa pré-planejada e objetivos fixados
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Uma articulação da iniciativa como entendida e continuamente renegociada pelos seus membros
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Domínio específico/interesses
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Prática/profissão compartilhada
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Fonte: Daniel e Schwier McCalla (2002, p.48) apud Moretti (2010, p. 174) apud SCHLEMMER
Segundo Moretti (2010 apud SCHLEMMER), ambos os tipos são difíceis de alcançar de maneira independente. É mais provável que coexistam em uma comunidade características de ambos os tipos, pois muitas vezes prática e aprendizagem estão intimamente ligadas com a comunidade.
Assim, podemos dizer que uma CVAP, um tipo de comunidade que é uma tendência mundial, se constitui pelo compartilhamento de práticas e pelo estudo e discussão de temas e interesses comuns aos membros da comunidade e, as regras e normas de funcionamento são definidas por meio de negociação no grupo. O conteúdo de uma CVAP é produzido nas interações que surgem a partir das discussões , das reflexões e das leituras sugeridas por qualquer membro da comunidade. O conhecimento é construído, e o sujeito aprende no processo de auto-organização do próprio pensamento conceitual, na medida em que necessita coordenar seu ponto de vista com os demais.
O papel do tutor e do aluno nas comunidades ligadas a cursos
Palloff e Pratt (2004 apud LOPES) destacam três questões sobre as comunidades de aprendizagem on line que estão diretamente ligadas a cursos, existindo, portanto, professor e aluno (nesse contexto, consideramos tutor e professor sinônimos):
- o papel do aluno na formação da comunidade: passada a fase inicial, na qual o professor norteia os trabalhos, incentivando a participação ativa dos alunos, estes devem assumir a responsabilidade de, juntamente com o professor, fazer do grupo uma comunidade. Nesse sentido, o aluno virtual deve ser aberto (compartilhando não só as experiências educacionais, mas também, detalhes de sua vida pessoal e profissional), flexível (sabendo lidar com dificuldades, mantendo o bom humor, desenvolvendo a compreensão da natureza da aprendizagem on line), honesto (dando e recebendo feedback, compartilhando pensamentos e preocupações), disposto a assumir responsabilidade na formação da comunidade e a trabalhar em conjunto;
- ampliação máxima da interação: apenas entrar no site regularmente e não apresentar contribuições para discussão é pouco para sustentar o desenvolvimento da comunidade de aprendizagem. Quando usado adequadamente, o chat pode ser um bom auxiliar para o curso. No entanto, a discussão síncrona não deve ser o único meio para a integração dos alunos. Incentivar a discussão assíncrona é a melhor forma de sustentar a interatividade de um curso on line;
- transmissão de conteúdos: o professor deve transmitir conteúdos sem comprometer a interação e a formação da comunidade e, para tanto, deve aprender a fazer perguntas amplas e que atinjam um equilíbrio entre interação em excesso e interação insuficiente. As questões devem promover reflexões.
Alexandre M. Gomes
Referências
VIEIRA, Naldeir dos Santos. O papel das comunidades de prática na aprendizagem organizacional. Disponível em: <http://www.aedb.br/seget/ artigos06/557_Artigo%20final% 20de%20aprendizagem%20Seget. pdf>. Acesso em: 28 Nov. 2013.
SCHLEMMER, Eliane. A aprendizagem por meio de comunidades virtuais de prática. In: Educação a Distância. O estado da Arte. Vol. 2. Fredric Michael Litto, Marcos Formiga (Org.). Pearson Education do Brasil. 2012..
LOPES, A. M. A.; BARCELOS, G. T.; BATISTA, S. C. F.; MACEDO, S. H.; BEHAR, P. Análise de uma comunidade virtual: Comunidade Brasil Acadêmico. 2° Encontro de Educação a Distância. Inst. Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense. Disponível em: <http://www.essentiaeditora. iff.edu.br/index.php/ educaDistancia/article/view/ 1521/724>. Acesso em: 28 Nov. 2013.
[Via BBA]
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