Um dos quatro CEOs negros da lista das 500 maiores empresas (Fortune 500), fala em entrevista dada à professora Tsedal Neeley, para a Harvar...
Um dos quatro CEOs negros da lista das 500 maiores empresas (Fortune 500), fala em entrevista dada à professora Tsedal Neeley, para a Harvard Business School Working Knowledge, sobre a busca por uma vacina contra o coronavírus, como o racismo no local de trabalho impede o progresso da América e sua própria educação a apenas uma geração da escravidão.
Penso que o recorde para a vacina mais rápida já lançada no mercado foi a Merck na vacina contra caxumba. Demorou cerca de quatro anos. Nossa vacina mais recente para o Ebola durou cinco anos e meio. E por que demora tanto? Em primeiro lugar, requer uma avaliação científica rigorosa. E aqui nem entendemos o próprio vírus ou como o vírus afeta o sistema imunológico. Estamos começando aí. Estamos começando com uma proteína do spike [o “espinho” da “coroa” que dá o nome do coronavírus] como antígeno.
A vacina da Merck para o Ebola levou cinco anos e meio e só neste mês foi aprovada na Europa. A vacina para tuberculose levou 13 anos, rotavírus 15 anos e catapora 28 anos.
Frazier explicou que o processo de desenvolver uma vacina é demorado porque requer uma rigorosa avaliação científica. No caso da Covid, “nem sequer entendemos o vírus em si ou como o vírus afeta o sistema imunológico”.
O que mais me preocupa é que o público está com tanta fome, tão desesperado para voltar à normalidade, que está nos pressionando [a indústria farmacêutica] para mover as coisas cada vez mais rápido. Mas, em última análise, se você vai usar uma vacina em bilhões de pessoas, é melhor saber o que essa vacina faz.
“Há muitos exemplos de vacinas no passado que estimularam o sistema imunológico mas não conferiram proteção. E, infelizmente, há alguns casos em que não só não conferiu proteção mas ajudou o vírus a invadir a célula porque a vacina estava incompleta em termos de suas propriedades imunogênicas. Temos que ter muito cuidado”, disse Frazier.
No último quarto de século, houve apenas sete vacinas verdadeiramente novas introduzidas globalmente na prática clínica. Quando digo novo, significa que eles foram eficazes contra um patógeno para o qual não havia vacina. Existem apenas sete no último quarto de século, a Merck tem quatro, o resto do mundo tem três. Não quero me gabar. E há muitas coisas nas quais temos trabalhado desde os anos 80. Temos tentado obter uma vacina contra o HIV desde os anos 1980 e não tivemos sucesso.
Quando as pessoas dizem ao público que vai haver uma vacina até o final de 2020, por exemplo, eu acho que fazem um grave desserviço ao público. Não queremos apressar a vacina antes de termos uma ciência rigorosa.
Eu acho que quando as pessoas dizem ao público que haverá uma vacina até o final de 2020, por exemplo, eu acho que eles prestam um péssimo serviço ao público. Acho que, no final do dia, não queremos apressar a vacina antes de fazer ciência rigorosa. Vimos no passado, por exemplo, com a gripe suína, que essa vacina fez mais mal do que bem. Não temos um grande histórico de introdução de vacinas rapidamente no meio de uma pandemia. Queremos manter isso em mente.
Para o CEO da Merck, o anúncio que uma vacina está chegando leva políticos e população a reduzirem os cuidados com o vírus.
Além disso, Frasier acredita haver dois grandes problemas com relação à distribuição global dos medicamentos. Em primeiro lugar, o fato de estarmos vivendo uma época de ultranacionalismo em que os países querem pegar tudo para si e dizer: “Vou usar primeiro na minha própria população”, em vez de priorizar o uso nas populações globalmente que estão em maior risco.
A segunda questão é essa questão da fabricação em escala. Há sete bilhões e meio de pessoas no mundo. E nunca tivemos uma vacina que fosse usada em uma população tão grande. Dessa forma, mesmo com a vacina, fabricar nessa escala e ser capaz de distribuí-la particularmente nas áreas do mundo onde as pessoas não podem pagar pela vacina, onde o último quilômetro é o desafio maior, é um problema que ainda não foi resolvido (para se ter uma dimensão do problema, a indústria de vidros especializados para ampolas está tomando várias medidas para evitar o apagão de ampolas para vacinas).
E minha opinião é que, a menos que todos nós estejamos seguros, nenhum de nós está seguro. Quero dizer, quando você pensa sobre o mundo em que vivemos com as mudanças climáticas, com a perturbação do ecossistema, com as populações se movendo da maneira que fazem com a mobilidade humana do jeito que está, esta pandemia é apenas a primeira de muitas que poderíamos experimentar como uma espécie porque essas condições só vão piorar no futuro.
“Precisamos de políticos que tenham a vontade e a integridade para contar a verdade às pessoas”, disse o CEO da Merck. Ele então faz considerações sobre a volta às aulas pelas crianças.
Quando você pensa em mandar os filhos de volta à escola, teremos que encontrar uma maneira de fazer isso com segurança, porque os pais ficam presos se seus filhos estiverem em casa. E nas cidades do interior, por exemplo, muitos pais dependem das escolas para alimentar seus filhos: café da manhã, almoço e, muitas vezes, lanche depois da escola. Portanto, temos que encontrar uma maneira de abrir a creche. Você tem que encontrar uma maneira de abrir escolas, sem mencionar o fato de que o aprendizado à distância não funciona para todas as crianças.
Frazier também mostrou preocupação sobre a acessibilidade e a inclusão digital especialmente por parte das crianças. Com grande potencial para acentuar as desigualdades sociais que já existem.
Algumas crianças precisam estar presentes na sala de aula. Eles têm necessidades especiais. E de modo geral, pense nisso. Novamente, se você estiver olhando para a nossa população, há muitas pessoas que não têm acesso à banda larga, muito menos o tipo de dispositivo de que precisam. Portanto, essa ideia de que podemos conduzir a educação remotamente funcionará para algumas crianças, as crianças mais favorecidas, mas pegará as populações desfavorecidas e as afastará mais do que já estão.
Ele também tocou na questão do racismo nas empresas e nos EUA. Como um dos quatro CEOs representantes negros membros do Fortunate 500. Mister Frazier lembrou que essa pandemia revelou de modo agudo as grandes disparidades entre os grupos étnicos.
O afro-americano de acordo com um estudo em Yale tem 3,5 vezes mais probabilidade de morrer de COVID do que um branco. Alguém que é Latinx tem três vezes mais chances de morrer. Portanto, isso desmascarou esses enormes elementos estruturais de racismo que existiram neste país por muito tempo.
E arremata com o exemplo da própria Merck:
Temos nossos próprios problemas, mas pelo menos na equipe sênior, eu diria que entre as 10 pessoas mais importantes da empresa, os homens brancos são apenas quatro desses 10. Temos três afro-americanos. Temos um asiático-americano e duas mulheres. Portanto, fizemos um bom trabalho com a diversidade no topo, mas não tivemos a influência nos níveis abaixo que eu acho que precisamos ter. E eu assumo a responsabilidade por isso.
Para maiores informações acesse a entrevista completa (em inglês).
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