Quando se reduz o investimento em pesquisa científica e tecnológica a sociedade pode pagar um preço alto. Até mesmo com vidas. Nesse artigo ...
Quando se reduz o investimento em pesquisa científica e tecnológica a sociedade pode pagar um preço alto. Até mesmo com vidas. Nesse artigo Carlos Takeshi Hotta e Luciano Lopes Queiroz, ambos ligados à USP, opinam sobre o alcance desse prejuízo.
A pandemia do coronavírus (covid-19), desde que foi diagnosticada pela primeira vez em dezembro de 2019, oficialmente já matou mais de 16.000 pessoas ao redor do globo, trouxe bilhões de dólares de prejuízo para a economia dos países (ambos os números continuam aumentando), sendo a mais grave crise que o planeta enfrenta desde a 2ª Grande Guerra. Diante de um cenário obscuro como esse, um país deve ser capaz de responder rapidamente a eventos que colocam em risco a vida de sua população. E em tempos de crise, é a ciência que acaba trazendo luz para as respostas mais obscuras. Hoje, a ciência é a principal esperança contra o covid-19 e tem sido assim há séculos, inclusive no Brasil.
Em 2014, por exemplo, o vírus da zika entrou no nosso país, possivelmente durante a Copa do Mundo. Sua silenciosa proliferação só foi percebida em abril de 2015, com o primeiro surto sendo confirmado em Salvador. No mesmo ano também se iniciou um surto de casos de microcefalia em crianças recém-nascidas, que saltou de centenas de casos para milhares em 2016.
Sem essa conexão, o surto de microcefalia teria continuado e aumentado, tornando-se um gravíssimo problema de saúde pública. O vírus da zika já era conhecido desde 1947, mas até então, ele era considerado apenas um parente mais brando do vírus da dengue.
Quando a epidemia do zika começou no Brasil, em 2014, os cortes de recursos na ciência estavam apenas no início e a estrutura de pesquisa ainda estava consolidada. Hoje, seis anos depois de sucessivos cortes no orçamento da ciência, nossa capacidade de resposta ao covid-19 está reduzida. Agências de apoio à ciência sofreram diversas restrições de recurso, mudanças estruturais e sucateamento. Com isso, muitos cientistas deixaram o Brasil, desarticulando grupos de pesquisa e reduzindo a disponibilidade de mão de obra qualificada para enfrentar os efeitos da pandemia no Brasil.
Agora, com o início da pandemia do coronavírus, a demanda por equipamentos e materiais de consumos utilizados em laboratórios de pesquisa e clínicos aumentou e kits básicos para isolamento do material genético e análises diagnósticas do covid-19 começaram a faltar. Ao destruir as agências de financiamento da Ciência brasileira e atacar as universidades públicas, ficamos cada vez mais dependentes da importação de tecnologias desenvolvidas em outros países e perdemos a capacidade de desenvolver uma indústria tecnológica própria.
Nos próximos anos, muitos outros problemas surgirão: enfrentamos uma crise climática que ameaça nossa segurança hídrica e nossa segurança alimentar, enfrentaremos o surgimento e proliferação de novas doenças, veremos as mudanças sociais provocadas pelas novas formas de trabalho e pelos novas aplicações em Inteligência Artificial. Sem cientistas brasileiros estudando e pensando o nosso país e o mundo, orientando políticas públicas em conjunto aos políticos eleitos e criando novas tecnologias para fortalecer a indústria nacional, perdemos o controle sobre o nosso futuro, abrindo mão de nossa soberania e colocando em risco nossa população.
Os autores
Carlos Takeshi Hotta é professor do Instituto de Química da USP
Luciano Lopes Queiroz é doutorando em Microbiologia do Instituto de Ciência Biomédicas da USP
Fonte: Agência Bori
[Visto no Brasil Acadêmico]
A pandemia do coronavírus (covid-19), desde que foi diagnosticada pela primeira vez em dezembro de 2019, oficialmente já matou mais de 16.000 pessoas ao redor do globo, trouxe bilhões de dólares de prejuízo para a economia dos países (ambos os números continuam aumentando), sendo a mais grave crise que o planeta enfrenta desde a 2ª Grande Guerra. Diante de um cenário obscuro como esse, um país deve ser capaz de responder rapidamente a eventos que colocam em risco a vida de sua população. E em tempos de crise, é a ciência que acaba trazendo luz para as respostas mais obscuras. Hoje, a ciência é a principal esperança contra o covid-19 e tem sido assim há séculos, inclusive no Brasil.
Em 2014, por exemplo, o vírus da zika entrou no nosso país, possivelmente durante a Copa do Mundo. Sua silenciosa proliferação só foi percebida em abril de 2015, com o primeiro surto sendo confirmado em Salvador. No mesmo ano também se iniciou um surto de casos de microcefalia em crianças recém-nascidas, que saltou de centenas de casos para milhares em 2016.
A situação só não foi pior porque cientistas brasileiros associaram o vírus da zika à má formação do cérebro dos recém-nascidos.
Sem essa conexão, o surto de microcefalia teria continuado e aumentado, tornando-se um gravíssimo problema de saúde pública. O vírus da zika já era conhecido desde 1947, mas até então, ele era considerado apenas um parente mais brando do vírus da dengue.
Quando a epidemia do zika começou no Brasil, em 2014, os cortes de recursos na ciência estavam apenas no início e a estrutura de pesquisa ainda estava consolidada. Hoje, seis anos depois de sucessivos cortes no orçamento da ciência, nossa capacidade de resposta ao covid-19 está reduzida. Agências de apoio à ciência sofreram diversas restrições de recurso, mudanças estruturais e sucateamento. Com isso, muitos cientistas deixaram o Brasil, desarticulando grupos de pesquisa e reduzindo a disponibilidade de mão de obra qualificada para enfrentar os efeitos da pandemia no Brasil.
Quando cortamos o financiamento destinado a pesquisas e a bolsas de cientistas e futuros cientistas, abrimos mão de nossa capacidade de combater e identificar ameaças.
Agora, com o início da pandemia do coronavírus, a demanda por equipamentos e materiais de consumos utilizados em laboratórios de pesquisa e clínicos aumentou e kits básicos para isolamento do material genético e análises diagnósticas do covid-19 começaram a faltar. Ao destruir as agências de financiamento da Ciência brasileira e atacar as universidades públicas, ficamos cada vez mais dependentes da importação de tecnologias desenvolvidas em outros países e perdemos a capacidade de desenvolver uma indústria tecnológica própria.
Nos próximos anos, muitos outros problemas surgirão: enfrentamos uma crise climática que ameaça nossa segurança hídrica e nossa segurança alimentar, enfrentaremos o surgimento e proliferação de novas doenças, veremos as mudanças sociais provocadas pelas novas formas de trabalho e pelos novas aplicações em Inteligência Artificial. Sem cientistas brasileiros estudando e pensando o nosso país e o mundo, orientando políticas públicas em conjunto aos políticos eleitos e criando novas tecnologias para fortalecer a indústria nacional, perdemos o controle sobre o nosso futuro, abrindo mão de nossa soberania e colocando em risco nossa população.
Os autores
Carlos Takeshi Hotta é professor do Instituto de Química da USP
Luciano Lopes Queiroz é doutorando em Microbiologia do Instituto de Ciência Biomédicas da USP
Fonte: Agência Bori
[Visto no Brasil Acadêmico]
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