Estão chegando máquinas que podem pensar, aprender e adaptar-se. Isso poderá significar que nós, seres humanos, terminaremos com significati...
Estão chegando máquinas que podem pensar, aprender e adaptar-se. Isso poderá significar que nós, seres humanos, terminaremos com significativas taxas de desemprego. O que devemos fazer a respeito? Em uma palestra direta sobre uma ideia controversa, o futurista Martin Ford defende a ideia de dividir a renda do trabalho tradicional e instituir uma renda básica universal.
Vou começar com uma pergunta assustadora: estamos caminhando para um futuro sem empregos? O notável progresso que temos visto em tecnologias como carros autônomos tem levado a uma explosão de interesse sobre este assunto. Mas, por ser uma pergunta que foi feita tantas vezes no passado, talvez devêssemos perguntar se, desta vez, será realmente diferente. O medo de que a automação possa substituir trabalhadores e provocar muito desemprego em potencial remonta a, pelo menos, 200 anos para o Ludismo na Inglaterra. Desde então, essa preocupação tem reaparecido várias vezes.
Imagino que muitos de vocês provavelmente nunca tenham ouvido falar do relatório da Revolução Verde. Foi um relatório muito importante, elaborado por um grupo de pessoas brilhantes, que incluiu dois vencedores do Prêmio Nobel. Esse relatório foi apresentado ao presidente norte-americano, e demonstrou que os EUA estavam à beira de uma crise econômica e social, porque a automação industrial iria deixar milhões de pessoas sem emprego. O relatório foi enviado ao presidente Lyndon Johnson em março de 1964. Faz mais de 50 anos e, é claro, aquilo não aconteceu de fato. É sempre a mesma história.
Esse alarme tem soado repetidamente, mas tem sido sempre um falso alarme. Por esse motivo, tem levado a uma forma muito convencional de pensar nisso. Na sua essência, a tecnologia pode devastar indústrias inteiras e fazer desaparecer ocupações e tipos de trabalho. Mas, ao mesmo tempo, o progresso levará a coisas completamente novas. Assim haverá novas indústrias que surgirão no futuro, e essas indústrias terão que contratar pessoas. Surgirão novos tipos de trabalho, que podem ser coisas que hoje nem podemos imaginar. Essa tem sido a história até agora, uma história positiva.
Acontece que os novos empregos criados são, geralmente, muito melhores que os antigos. São, por exemplo, mais atraentes, com ambientes de trabalho mais seguros, confortáveis, e são mais bem pagos. Tem sido uma história positiva. É assim que as coisas têm acontecido até agora. Mas há uma classe específica de trabalhadores para os quais a história tem sido bem diferente. Para esses trabalhadores, a tecnologia tem dizimado completamente o seu trabalho, não tendo criado nenhuma oportunidade. Esses trabalhadores, é claro, são os cavalos.
(Risos)
Então posso fazer uma pergunta provocadora: será possível, em algum momento do futuro, uma fração significativa do trabalho humano se tornar redundante do mesmo modo que se tornaram os cavalos? Podemos ter uma reação muito instintiva e reflexiva. Podemos dizer:
Os cavalos são muito limitados e, quando chegaram os carros, caminhões e tratores, os cavalos não tiveram para onde ir. As pessoas, por outro lado, são inteligentes podemos aprender e nos adaptar. Em teoria, isso significa que podemos sempre achar algo novo para fazer e permanecer relevantes para a economia do futuro.
Mas temos que compreender uma coisa realmente crítica. As máquinas que irão ameaçar os trabalhadores, no futuro, não se comparam àqueles carros, caminhões e tratores que substituíram os cavalos. O futuro estará cheio de máquinas pensantes, instruídas e adaptáveis. Isso realmente significa que a tecnologia está finalmente começando a invadir a capacidade humana fundamental, aquilo que nos torna tão diferentes dos cavalos, e que, até agora, tem nos permitido estar à frente da marcha do progresso e permanecer relevantes e indispensáveis à economia. O que é tão diferente quanto à tecnologia da informação atual em relação ao passado? Eu apontaria três coisas fundamentais.
A primeira é que temos visto esse processo em andamento em aceleração exponencial. Sei que todos conhecem a Lei de Moore, mas é ainda mais amplo do que isso. Estende-se, em muitos casos, por exemplo, ao software, às comunicações, à banda larga e assim por diante. Mas a chave para o entendimento é que essa aceleração vem ocorrendo há muito tempo, há décadas. Se medirmos a partir do final dos anos 50, quando foram fabricados os primeiros circuitos integrados, veremos que a capacidade dos computadores aumentou 30 vezes desde então. É um número extraordinário de vezes para aumentar qualquer quantidade. Significa realmente que chegamos ao ponto de ver um progresso extraordinário e que as coisas continuarão a acelerar a partir desse ponto.
A segunda coisa muito importante é que as máquinas, de forma limitada, estão começando a pensar. Não estou falando de IA ao nível humano, nem de inteligência artificial de ficção científica. Simplesmente quero dizer que máquinas e algoritmos estão tomando decisões, resolvendo problemas e, o mais importante, aprendendo. Na verdade, se há uma tecnologia principal, que tem se tornado a força motora por trás disso, é o aprendizado das máquinas, uma tecnologia incrivelmente poderosa, perturbadora e crescente.
Um dos melhores exemplos que vi recentemente foi o que o DeepMind da Google é capaz de fazer com seu sistema AlphaGo. Foi o sistema capaz de vencer o melhor jogador do mundo no antigo jogo Go. Para mim, pelo menos, há duas coisas que se destacam no jogo Go. Uma é que, enquanto jogamos, o número de configurações que o tabuleiro pode conter é praticamente infinito. Há mais possibilidades do que há átomos no universo. Isso significa que nunca será possível construir um computador que ganhe no jogo Go, da forma como o xadrez foi abordado, por exemplo, que é basicamente introduzir nele uma força bruta de capacidade de cálculo. Claramente, é necessária uma abordagem muito mais sofisticada e pensadora. A segunda coisa que se destaca é que, se falarmos com um dos vencedores do campeonato Go, essa pessoa nem sempre consegue expressar no que está pensando enquanto joga. É frequentemente algo muito intuitivo, é quase como uma sensação do movimento que tem de fazer.
Dadas essas duas qualidades, eu diria que jogar Go a nível de campeonato mundial deveria estar fora de perigo de ser automatizado, e o fato de não estar deveria acionar um sinal de alerta para nós. A razão para isso é que temos a tendência de traçar uma linha muito distinta, colocando de um lado dessa linha todos os empregos e tarefas que consideramos de um nível rotineiro, repetitivo e previsível. Sabemos que os empregos podem estar em diferentes indústrias, ocupações e níveis de habilidade, mas, como são, por natureza, previsíveis, sabemos que, a certa altura, serão suscetíveis ao aprendizado pelas máquinas e, por consequência, à automação. Não se iludam, são muitos empregos, algo da ordem de cerca da metade dos empregos da economia.
A solução da Google para este problema, sugere que essa linha será muito dinâmica. Irá se deslocar de um modo que consumirá cada vez mais empregos e tarefas que consideramos hoje fora de perigo de serem automatizados.
Outro ponto fundamental a entender é que não se trata apenas de empregos de baixo salário ou de operários, ou de trabalhos e tarefas feitas por pessoas com baixo nível de instrução. Muitos indícios mostram que as tecnologias estão rapidamente subindo a escada das habilidades. Já vimos o impacto em empregos profissionais, tarefas feitas por pessoas como contadores, analistas financeiros, jornalistas, advogados, radiologistas e outros. Muitas das hipóteses que fazemos sobre o tipo de ocupações, tarefas e trabalhos ameaçados pela automação no futuro são muito prováveis de serem desafiados a continuar.
Quando juntamos essas tendências, penso que isso nos mostra que podemos chegar a um futuro com um desemprego significativo. Ou, no mínimo, podemos enfrentar muito subemprego ou salários estagnados, talvez até salários em queda e elevados níveis de desigualdade. Tudo isso criará uma quantidade terrível de tensão no tecido social. Mas, além disso, há um problema econômico fundamental, que surge porque os empregos são, atualmente, o principal mecanismo de distribuição de renda e, portanto, do poder de compra a todos os consumidores dos produtos e serviços que produzimos.
Para um mercado econômico vibrante, é preciso haver muitos consumidores que possam comprar os produtos e serviços que estão sendo produzidos. Se não tivermos isso, corremos o risco de uma estagnação econômica, ou talvez até de uma espiral econômica em queda, por não haver consumidores suficientes para comprar os produtos e serviços produzidos.
É realmente importante perceber que todos nós, como indivíduos, dependemos do acesso a essa economia de mercado para ter sucesso. Podemos visualizar isso pensando em uma pessoa realmente excepcional. Imaginem, por um momento, que pegamos Steve Jobs e o largamos sozinho em uma ilha. Ele vai dar a volta na ilha, catar cocos, como qualquer pessoa. Não irá fazer nada de especial, porque não haverá nenhum mercado para desenvolver o incrível talento dele. O acesso a esse mercado é fundamental para nós enquanto indivíduos, e também para todo o sistema em termos de sustentabilidade.
A questão passa a ser: o que podemos fazer a respeito? Acho que podemos ver isso por uma moldura utópica, imaginar um futuro em que todos trabalharemos menos, teremos mais tempo para nos divertir, passar com a família, fazer coisas que consideramos realmente recompensadoras, e assim por diante. Considero uma visão maravilhosa, algo pelo qual deveríamos nos esforçar para alcançar. Mas, ao mesmo tempo, penso que devemos ser realistas, e temos que perceber que é provável que enfrentemos um problema significativo de distribuição de renda. Provavelmente muitas pessoas serão deixadas para trás. Acredito que, para resolver esse problema, teremos, no final, que achar uma forma de dividir a renda do trabalho tradicional. A forma melhor e mais direta que conheço para isso é um tipo de renda garantida ou renda básica universal.
Essa renda está se tornando uma ideia importante, ganhando muita atração e atenção. Há muitos projetos-pilotos importantes e experiências acontecendo no mundo todo. Meu ponto de vista é que a renda básica não é uma panaceia, não é necessariamente uma solução do tipo “ligar e usar”. Pelo contrário, é um lugar para começar, uma ideia que podemos construir e refinar. Por exemplo, uma coisa sobre a qual já escrevi muito é a possibilidade de incorporar incentivos explícitos na renda básica. Para ilustrar, imaginem que são alunos do ensino médio com dificuldades, com risco de abandonar a escola. Suponham que saibam ainda que, a certa altura, no futuro, haja o que houver, terão a mesma renda básica de qualquer outra pessoa. Para mim, isso cria um incentivo muito perverso para vocês desistirem e abandonarem a escola.
Eu diria para não estruturar as coisas assim. Em vez disso, vamos pagar mais às pessoas que concluírem o ensino médio do que àquelas que o abandonarem. Podemos pegar a ideia de criar incentivos em uma renda básica e talvez estender a outras áreas. Por exemplo, podemos criar um incentivo ao trabalho na comunidade para ajudar outras pessoas, ou talvez fazer coisas positivas para o ambiente, e assim por diante. Ao incorporar incentivos a uma renda básica, podemos efetivamente melhorá-la, e talvez, também, dar alguns passos para resolver outro problema que muito provavelmente enfrentaremos no futuro, ou seja, como todos nós achamos significado e satisfação e como ocupamos nosso tempo num mundo em que talvez exista menor procura por trabalho tradicional.
Creio que uma das objeções mais fundamentais, quase instintivas que a maioria de nós tem à ideia de uma renda básica, ou a qualquer expansão significativa da rede de segurança, é o medo de que acabaremos com muitas pessoas andando no carro da economia e poucas pessoas puxando esse carro. No entanto, a questão que quero enfatizar aqui é que, no futuro, as máquinas serão cada vez mais capazes de puxar esse carro para nós.
Isso deveria nos dar mais opções para a forma como estruturamos a sociedade e a economia. Penso que, por fim, isso deixará de ser apenas uma opção e se tornará obrigatório. A razão é que tudo isso vai provocar uma enorme tensão na sociedade, e também porque os empregos são o mecanismo que dá poder de compra aos consumidores para que possam fazer a economia andar. Se, de fato, esse mecanismo começar a se desgastar no futuro, teremos que substituí-lo por outra coisa senão enfrentaremos o risco de todo o sistema não poder ser sustentável.
O mais importante aqui é que penso realmente que resolver estes problemas e, em especial, achar uma forma de construir uma futura economia que funcione para todos, em todos os níveis de nossa sociedade, será um dos mais importantes desafios que enfrentaremos nos próximos anos e nas próximas décadas.
Muito obrigado.
(Aplausos)
Fonte: TED
[Visto no Brasil Acadêmico]
Vou começar com uma pergunta assustadora: estamos caminhando para um futuro sem empregos? O notável progresso que temos visto em tecnologias como carros autônomos tem levado a uma explosão de interesse sobre este assunto. Mas, por ser uma pergunta que foi feita tantas vezes no passado, talvez devêssemos perguntar se, desta vez, será realmente diferente. O medo de que a automação possa substituir trabalhadores e provocar muito desemprego em potencial remonta a, pelo menos, 200 anos para o Ludismo na Inglaterra. Desde então, essa preocupação tem reaparecido várias vezes.
Imagino que muitos de vocês provavelmente nunca tenham ouvido falar do relatório da Revolução Verde. Foi um relatório muito importante, elaborado por um grupo de pessoas brilhantes, que incluiu dois vencedores do Prêmio Nobel. Esse relatório foi apresentado ao presidente norte-americano, e demonstrou que os EUA estavam à beira de uma crise econômica e social, porque a automação industrial iria deixar milhões de pessoas sem emprego. O relatório foi enviado ao presidente Lyndon Johnson em março de 1964. Faz mais de 50 anos e, é claro, aquilo não aconteceu de fato. É sempre a mesma história.
Esse alarme tem soado repetidamente, mas tem sido sempre um falso alarme. Por esse motivo, tem levado a uma forma muito convencional de pensar nisso. Na sua essência, a tecnologia pode devastar indústrias inteiras e fazer desaparecer ocupações e tipos de trabalho. Mas, ao mesmo tempo, o progresso levará a coisas completamente novas. Assim haverá novas indústrias que surgirão no futuro, e essas indústrias terão que contratar pessoas. Surgirão novos tipos de trabalho, que podem ser coisas que hoje nem podemos imaginar. Essa tem sido a história até agora, uma história positiva.
Acontece que os novos empregos criados são, geralmente, muito melhores que os antigos. São, por exemplo, mais atraentes, com ambientes de trabalho mais seguros, confortáveis, e são mais bem pagos. Tem sido uma história positiva. É assim que as coisas têm acontecido até agora. Mas há uma classe específica de trabalhadores para os quais a história tem sido bem diferente. Para esses trabalhadores, a tecnologia tem dizimado completamente o seu trabalho, não tendo criado nenhuma oportunidade. Esses trabalhadores, é claro, são os cavalos.
(Risos)
Então posso fazer uma pergunta provocadora: será possível, em algum momento do futuro, uma fração significativa do trabalho humano se tornar redundante do mesmo modo que se tornaram os cavalos? Podemos ter uma reação muito instintiva e reflexiva. Podemos dizer:
“Que absurdo!” “Como se pode comparar seres humanos com cavalos?”
Os cavalos são muito limitados e, quando chegaram os carros, caminhões e tratores, os cavalos não tiveram para onde ir. As pessoas, por outro lado, são inteligentes podemos aprender e nos adaptar. Em teoria, isso significa que podemos sempre achar algo novo para fazer e permanecer relevantes para a economia do futuro.
Mas temos que compreender uma coisa realmente crítica. As máquinas que irão ameaçar os trabalhadores, no futuro, não se comparam àqueles carros, caminhões e tratores que substituíram os cavalos. O futuro estará cheio de máquinas pensantes, instruídas e adaptáveis. Isso realmente significa que a tecnologia está finalmente começando a invadir a capacidade humana fundamental, aquilo que nos torna tão diferentes dos cavalos, e que, até agora, tem nos permitido estar à frente da marcha do progresso e permanecer relevantes e indispensáveis à economia. O que é tão diferente quanto à tecnologia da informação atual em relação ao passado? Eu apontaria três coisas fundamentais.
A primeira é que temos visto esse processo em andamento em aceleração exponencial. Sei que todos conhecem a Lei de Moore, mas é ainda mais amplo do que isso. Estende-se, em muitos casos, por exemplo, ao software, às comunicações, à banda larga e assim por diante. Mas a chave para o entendimento é que essa aceleração vem ocorrendo há muito tempo, há décadas. Se medirmos a partir do final dos anos 50, quando foram fabricados os primeiros circuitos integrados, veremos que a capacidade dos computadores aumentou 30 vezes desde então. É um número extraordinário de vezes para aumentar qualquer quantidade. Significa realmente que chegamos ao ponto de ver um progresso extraordinário e que as coisas continuarão a acelerar a partir desse ponto.
Conforme esperamos pelos próximos anos e décadas, creio que veremos coisas para as quais não estamos preparados, coisas surpreendentes.
A segunda coisa muito importante é que as máquinas, de forma limitada, estão começando a pensar. Não estou falando de IA ao nível humano, nem de inteligência artificial de ficção científica. Simplesmente quero dizer que máquinas e algoritmos estão tomando decisões, resolvendo problemas e, o mais importante, aprendendo. Na verdade, se há uma tecnologia principal, que tem se tornado a força motora por trás disso, é o aprendizado das máquinas, uma tecnologia incrivelmente poderosa, perturbadora e crescente.
Um dos melhores exemplos que vi recentemente foi o que o DeepMind da Google é capaz de fazer com seu sistema AlphaGo. Foi o sistema capaz de vencer o melhor jogador do mundo no antigo jogo Go. Para mim, pelo menos, há duas coisas que se destacam no jogo Go. Uma é que, enquanto jogamos, o número de configurações que o tabuleiro pode conter é praticamente infinito. Há mais possibilidades do que há átomos no universo. Isso significa que nunca será possível construir um computador que ganhe no jogo Go, da forma como o xadrez foi abordado, por exemplo, que é basicamente introduzir nele uma força bruta de capacidade de cálculo. Claramente, é necessária uma abordagem muito mais sofisticada e pensadora. A segunda coisa que se destaca é que, se falarmos com um dos vencedores do campeonato Go, essa pessoa nem sempre consegue expressar no que está pensando enquanto joga. É frequentemente algo muito intuitivo, é quase como uma sensação do movimento que tem de fazer.
Dadas essas duas qualidades, eu diria que jogar Go a nível de campeonato mundial deveria estar fora de perigo de ser automatizado, e o fato de não estar deveria acionar um sinal de alerta para nós. A razão para isso é que temos a tendência de traçar uma linha muito distinta, colocando de um lado dessa linha todos os empregos e tarefas que consideramos de um nível rotineiro, repetitivo e previsível. Sabemos que os empregos podem estar em diferentes indústrias, ocupações e níveis de habilidade, mas, como são, por natureza, previsíveis, sabemos que, a certa altura, serão suscetíveis ao aprendizado pelas máquinas e, por consequência, à automação. Não se iludam, são muitos empregos, algo da ordem de cerca da metade dos empregos da economia.
Do outro lado dessa linha, temos todos os trabalhos que requerem alguma competência que consideramos unicamente humana. São os trabalhos que consideramos seguros. Baseado no que sei sobre o jogo Go, eu imaginaria que ele deveria estar no lado seguro dessa linha. Mas o fato é que não está.
A solução da Google para este problema, sugere que essa linha será muito dinâmica. Irá se deslocar de um modo que consumirá cada vez mais empregos e tarefas que consideramos hoje fora de perigo de serem automatizados.
Outro ponto fundamental a entender é que não se trata apenas de empregos de baixo salário ou de operários, ou de trabalhos e tarefas feitas por pessoas com baixo nível de instrução. Muitos indícios mostram que as tecnologias estão rapidamente subindo a escada das habilidades. Já vimos o impacto em empregos profissionais, tarefas feitas por pessoas como contadores, analistas financeiros, jornalistas, advogados, radiologistas e outros. Muitas das hipóteses que fazemos sobre o tipo de ocupações, tarefas e trabalhos ameaçados pela automação no futuro são muito prováveis de serem desafiados a continuar.
Quando juntamos essas tendências, penso que isso nos mostra que podemos chegar a um futuro com um desemprego significativo. Ou, no mínimo, podemos enfrentar muito subemprego ou salários estagnados, talvez até salários em queda e elevados níveis de desigualdade. Tudo isso criará uma quantidade terrível de tensão no tecido social. Mas, além disso, há um problema econômico fundamental, que surge porque os empregos são, atualmente, o principal mecanismo de distribuição de renda e, portanto, do poder de compra a todos os consumidores dos produtos e serviços que produzimos.
Para um mercado econômico vibrante, é preciso haver muitos consumidores que possam comprar os produtos e serviços que estão sendo produzidos. Se não tivermos isso, corremos o risco de uma estagnação econômica, ou talvez até de uma espiral econômica em queda, por não haver consumidores suficientes para comprar os produtos e serviços produzidos.
É realmente importante perceber que todos nós, como indivíduos, dependemos do acesso a essa economia de mercado para ter sucesso. Podemos visualizar isso pensando em uma pessoa realmente excepcional. Imaginem, por um momento, que pegamos Steve Jobs e o largamos sozinho em uma ilha. Ele vai dar a volta na ilha, catar cocos, como qualquer pessoa. Não irá fazer nada de especial, porque não haverá nenhum mercado para desenvolver o incrível talento dele. O acesso a esse mercado é fundamental para nós enquanto indivíduos, e também para todo o sistema em termos de sustentabilidade.
A questão passa a ser: o que podemos fazer a respeito? Acho que podemos ver isso por uma moldura utópica, imaginar um futuro em que todos trabalharemos menos, teremos mais tempo para nos divertir, passar com a família, fazer coisas que consideramos realmente recompensadoras, e assim por diante. Considero uma visão maravilhosa, algo pelo qual deveríamos nos esforçar para alcançar. Mas, ao mesmo tempo, penso que devemos ser realistas, e temos que perceber que é provável que enfrentemos um problema significativo de distribuição de renda. Provavelmente muitas pessoas serão deixadas para trás. Acredito que, para resolver esse problema, teremos, no final, que achar uma forma de dividir a renda do trabalho tradicional. A forma melhor e mais direta que conheço para isso é um tipo de renda garantida ou renda básica universal.
Essa renda está se tornando uma ideia importante, ganhando muita atração e atenção. Há muitos projetos-pilotos importantes e experiências acontecendo no mundo todo. Meu ponto de vista é que a renda básica não é uma panaceia, não é necessariamente uma solução do tipo “ligar e usar”. Pelo contrário, é um lugar para começar, uma ideia que podemos construir e refinar. Por exemplo, uma coisa sobre a qual já escrevi muito é a possibilidade de incorporar incentivos explícitos na renda básica. Para ilustrar, imaginem que são alunos do ensino médio com dificuldades, com risco de abandonar a escola. Suponham que saibam ainda que, a certa altura, no futuro, haja o que houver, terão a mesma renda básica de qualquer outra pessoa. Para mim, isso cria um incentivo muito perverso para vocês desistirem e abandonarem a escola.
Eu diria para não estruturar as coisas assim. Em vez disso, vamos pagar mais às pessoas que concluírem o ensino médio do que àquelas que o abandonarem. Podemos pegar a ideia de criar incentivos em uma renda básica e talvez estender a outras áreas. Por exemplo, podemos criar um incentivo ao trabalho na comunidade para ajudar outras pessoas, ou talvez fazer coisas positivas para o ambiente, e assim por diante. Ao incorporar incentivos a uma renda básica, podemos efetivamente melhorá-la, e talvez, também, dar alguns passos para resolver outro problema que muito provavelmente enfrentaremos no futuro, ou seja, como todos nós achamos significado e satisfação e como ocupamos nosso tempo num mundo em que talvez exista menor procura por trabalho tradicional.
Ao ampliar e refinar uma renda básica, podemos fazê-la parecer melhor e talvez também possamos torná-la mais aceitável e viável de forma política e social. Aumentaremos assim a possibilidade de isso realmente acontecer.
Creio que uma das objeções mais fundamentais, quase instintivas que a maioria de nós tem à ideia de uma renda básica, ou a qualquer expansão significativa da rede de segurança, é o medo de que acabaremos com muitas pessoas andando no carro da economia e poucas pessoas puxando esse carro. No entanto, a questão que quero enfatizar aqui é que, no futuro, as máquinas serão cada vez mais capazes de puxar esse carro para nós.
Isso deveria nos dar mais opções para a forma como estruturamos a sociedade e a economia. Penso que, por fim, isso deixará de ser apenas uma opção e se tornará obrigatório. A razão é que tudo isso vai provocar uma enorme tensão na sociedade, e também porque os empregos são o mecanismo que dá poder de compra aos consumidores para que possam fazer a economia andar. Se, de fato, esse mecanismo começar a se desgastar no futuro, teremos que substituí-lo por outra coisa senão enfrentaremos o risco de todo o sistema não poder ser sustentável.
O mais importante aqui é que penso realmente que resolver estes problemas e, em especial, achar uma forma de construir uma futura economia que funcione para todos, em todos os níveis de nossa sociedade, será um dos mais importantes desafios que enfrentaremos nos próximos anos e nas próximas décadas.
Muito obrigado.
(Aplausos)
Fonte: TED
[Visto no Brasil Acadêmico]
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