Em verdade, em verdade vos digo: A rainha enfurecida tentou estilhaçar o espelho que, sendo mágico, satisfez-lhe o primeiro ímpeto no intent...
Em verdade, em verdade vos digo: A rainha enfurecida tentou estilhaçar o espelho que, sendo mágico, satisfez-lhe o primeiro ímpeto no intento de acalmá-la; de conduzi-la a se recompor, a recuperar a razão.
A miríade de fragmentos não aconteceu realmente, não mais foi que uma ilusão para chocar a rainha e refazê-la em seu psicológico.
Recobrada a dita razão, logo veio um profundo arrependimento pela perda do amigo, do fã ardoroso, do incentivador perene. O pranto quase veio aos olhos da bela rainha. Quis de volta o conselheiro, o mais famoso espelho de todos os tempos em todo o mundo. O espelho então, mágico que era, voltou a brilhar no seu lugar de sempre refletindo as imagens, ora recatadas, ora adornadas apenas pela toalha que deslizando pelo corpo deixava à mostra, por partes, uma nudez que nunca era total, mas que com memória e imaginação acabava, como num quebra cabeças, compondo-se e revelando o todo. Paciente e atento, ia cada vez mais colhendo imagens e se escravizando naquele amor algo platônico e, a um só tempo, real.
- Espelho, espelho meu, onde é mesmo que mora essa ninfeta tão maravilhosa?
- Na Floresta Negra minha rainha. Habita a morada de uns anõezinhos mineradores que lhe deram guarida naquela vez em um caçador deveria tê-la eliminado mas não, condoeu-se da frágil criança e a deixou ir-se floresta a dentro, tendo quase a certeza de que ela não sobreviveria aos rigores e perigos da floresta.
- E o coração que comi pensando ser o dela, será possível tão torpe farsa?
- Era de um cervo (termo politicamente correto).
Maldito caçador, pensou a rainha que mesmo irada e decepcionada, não deixava de ser linda. Primeiro vou cuidar da branca como a neve, rubra como uma pequena gota de sangue provocada por uma espetada de agulha e de cabelos negros como o ébano ou a asa da graúna.
Ainda que ele habitasse além muito além daquela serra que ainda azula no horizonte, num lugar tão distante que até o pensamento levasse algum tempo para atingir; ainda assim eu a alcançaria. Morando logo ali, na floresta Negra; não tardarei em tê-la ao alcance das mão e de minha capacidade de envolve-la. Se bem pensou, melhor tratou de fazer.
Disfarçada de bondosa velhinha que andava pela floresta espalhando bondades populísticas, nossa encantadora rainha acabou por chegar na casinha dos 7 anões, ou seja de Branca de Neve. Como quase ninguém usasse andar por aquelas plagas, tão logo se aproximou, Branca de Neve apareceu na janela, ainda um pouco despenteada já que mal acabara de levantar-se, e assim não estava com a beleza em todo o seu fulgor.
Hum... Pensou a rainha. Essa aí é que é a tal de mais bela que eu? Uma pequena dúvida perpassou seu cérebro.
Cumprimentou gentilmente, fez um gracejo, um elogio; foi ganhando a confiança da boboca da Branca de Neve, até que lhe ofereceu um belíssimo pente, digno daqueles
cabelos negros, brilhantes e sedosos. Despediu-se e foi embora.
Mal cerrou a janela e já Branca de Neve, em sua vaidade pueril, intentou pentear-se. O pente era envenenado, talvez fosse curare o poderoso veneno usado em zarabatanas de caçadores de macacos; o fato, é que tão logo tentou pentear-se e já caiu inerte sobre alguma coisa macia que evitou uma concussão ou alguma fratura. Tudo indica que a capacidade de respirar ficou preservada pois, ao fim da tarde, quando os anões ali chegaram a encontraram caída e, logo que tiraram o tal pente de seus cabelos, ela já começou a melhorar e algum tempo depois já restabelecida, contou tudo a eles que então recomendaram ter todo cuidado com estranhos, não convidar para entrar e nem aceitar presentes.
Numa última e desesperada tentativa, talvez inspirada na história do paraíso, valeu-se de uma maçã envenenada e de uma lábia sibilina e sub-reptícia.
Envolveu completamente Branca de Neve com belos adjetivos, com verbos e advérbios bem colocados, com interjeições convincentes, com um substantivo atraente e fatal: uma maçã vermelho-dourada, irresistível e cuidadosamente envenenada.
Para ganhar completamente a confiança da púbere criatura, partiu a suculenta maçã ao meio e começou a comer uma metade, oferecendo a outra metade à inocente Branca que, com as glândulas salivares inundando-lhe a boca, não ofereceu qualquer resistência. Tomou a sua metade, até com certa voracidade e mordeu um grande naco.
A rainha zarpou-se e foi novamente conversar com o espelho que a encheu de certezas e elogios.
Chegando em casa, após extenuante dia de trabalho, os anões desesperaram-se e tentaram de tudo para trazer de volta à vida a mais linda criatura que já tinham visto.
Depois de vários e inúteis esforços, ventilando com um abanador, usando os mais poderosos e modernos aromatizantes, aspergindo-lhe o rosto com agua fria, chamando-a pelo nome, mandando que piscasse etc etc. Deram-se por vencidos. No entanto perceberam que sua beleza se mantinha, havia uma perfusão adivinhada, uma insuspeitada oxigenação ainda que mínima.
- Vamos conservá-la numa redoma de cristal no alto daquela colina, cercada de um jardim de lírios e rosas.
E assim fizeram.
O pior não aconteceu, porque logo apareceu um príncipe o qual, vendo tão bela criatura naquela redoma, pediu que lhe a dessem para que a tivesse conservada em seu palácio com todo cuidado.
Os anões anuíram. Não sem antes promoverem um rápido conciliábulo entre eles mesmos. No trajeto para o palácio, no caminho tinha uma pedra, uma providencial pedra no caminho provocou tão rude bacada que o corpo foi sacudido e um pedaço de maçã que se alojara na garganta de B. Neve, foi expelido e com as vias aéreas totalmente livres e também livre da ação do veneno, Branca de Neve recobrou a vida.
O casamento deu-se tempos depois, com uma festa tão linda e grandiosa que ficou na história para sempre. Compareceu à festa, após a cerimônia religiosa, luterana ou católica, não está claro; gentes de toda a redondeza: os anões, o caçador que não matou, serviçais, o velho rei pai de Branca e a Rainha que assistiu comportadamente o matrimônio, despediu-se cumprimentando os noivos polidamente e se retirou denotando visível depressão e, por isso corre o boato de tenha se lançado em um precipício em busca da morte. Esse autor, de coração compreensivo, valorizador de mulheres pós trinta, pós quarenta... pós 50, pós n...; acha que a família acabou por se entender, houve um perdão abrangente e geral dos personagens (acordão) e todos viveram felizes para sempre.
[Visto no Brasil Acadêmico]
A miríade de fragmentos não aconteceu realmente, não mais foi que uma ilusão para chocar a rainha e refazê-la em seu psicológico.
Recobrada a dita razão, logo veio um profundo arrependimento pela perda do amigo, do fã ardoroso, do incentivador perene. O pranto quase veio aos olhos da bela rainha. Quis de volta o conselheiro, o mais famoso espelho de todos os tempos em todo o mundo. O espelho então, mágico que era, voltou a brilhar no seu lugar de sempre refletindo as imagens, ora recatadas, ora adornadas apenas pela toalha que deslizando pelo corpo deixava à mostra, por partes, uma nudez que nunca era total, mas que com memória e imaginação acabava, como num quebra cabeças, compondo-se e revelando o todo. Paciente e atento, ia cada vez mais colhendo imagens e se escravizando naquele amor algo platônico e, a um só tempo, real.
Enfim, ali estava o espelho. Aqui estava a rainha e, num bosque não muito longe dali estava Branca de Neve, leve e solta, inculta e bela como a última flor do lácio.
- Espelho, espelho meu, onde é mesmo que mora essa ninfeta tão maravilhosa?
- Na Floresta Negra minha rainha. Habita a morada de uns anõezinhos mineradores que lhe deram guarida naquela vez em um caçador deveria tê-la eliminado mas não, condoeu-se da frágil criança e a deixou ir-se floresta a dentro, tendo quase a certeza de que ela não sobreviveria aos rigores e perigos da floresta.
- E o coração que comi pensando ser o dela, será possível tão torpe farsa?
- Era de um cervo (termo politicamente correto).
Maldito caçador, pensou a rainha que mesmo irada e decepcionada, não deixava de ser linda. Primeiro vou cuidar da branca como a neve, rubra como uma pequena gota de sangue provocada por uma espetada de agulha e de cabelos negros como o ébano ou a asa da graúna.
Ainda que ele habitasse além muito além daquela serra que ainda azula no horizonte, num lugar tão distante que até o pensamento levasse algum tempo para atingir; ainda assim eu a alcançaria. Morando logo ali, na floresta Negra; não tardarei em tê-la ao alcance das mão e de minha capacidade de envolve-la. Se bem pensou, melhor tratou de fazer.
Disfarçada de bondosa velhinha que andava pela floresta espalhando bondades populísticas, nossa encantadora rainha acabou por chegar na casinha dos 7 anões, ou seja de Branca de Neve. Como quase ninguém usasse andar por aquelas plagas, tão logo se aproximou, Branca de Neve apareceu na janela, ainda um pouco despenteada já que mal acabara de levantar-se, e assim não estava com a beleza em todo o seu fulgor.
Hum... Pensou a rainha. Essa aí é que é a tal de mais bela que eu? Uma pequena dúvida perpassou seu cérebro.
Bem, mas eu vim aqui para fazer julgamentos ou para eliminar o inimigo?... Perguntou-se num balbucio.
Cumprimentou gentilmente, fez um gracejo, um elogio; foi ganhando a confiança da boboca da Branca de Neve, até que lhe ofereceu um belíssimo pente, digno daqueles
cabelos negros, brilhantes e sedosos. Despediu-se e foi embora.
Mal cerrou a janela e já Branca de Neve, em sua vaidade pueril, intentou pentear-se. O pente era envenenado, talvez fosse curare o poderoso veneno usado em zarabatanas de caçadores de macacos; o fato, é que tão logo tentou pentear-se e já caiu inerte sobre alguma coisa macia que evitou uma concussão ou alguma fratura. Tudo indica que a capacidade de respirar ficou preservada pois, ao fim da tarde, quando os anões ali chegaram a encontraram caída e, logo que tiraram o tal pente de seus cabelos, ela já começou a melhorar e algum tempo depois já restabelecida, contou tudo a eles que então recomendaram ter todo cuidado com estranhos, não convidar para entrar e nem aceitar presentes.
Contam que a rainha fez várias e ardilosas tentativas mais, com o mesmo intento: eliminar a concorrência.
Numa última e desesperada tentativa, talvez inspirada na história do paraíso, valeu-se de uma maçã envenenada e de uma lábia sibilina e sub-reptícia.
Envolveu completamente Branca de Neve com belos adjetivos, com verbos e advérbios bem colocados, com interjeições convincentes, com um substantivo atraente e fatal: uma maçã vermelho-dourada, irresistível e cuidadosamente envenenada.
Para ganhar completamente a confiança da púbere criatura, partiu a suculenta maçã ao meio e começou a comer uma metade, oferecendo a outra metade à inocente Branca que, com as glândulas salivares inundando-lhe a boca, não ofereceu qualquer resistência. Tomou a sua metade, até com certa voracidade e mordeu um grande naco.
Caiu, dessa vez, como morta.
A rainha zarpou-se e foi novamente conversar com o espelho que a encheu de certezas e elogios.
Chegando em casa, após extenuante dia de trabalho, os anões desesperaram-se e tentaram de tudo para trazer de volta à vida a mais linda criatura que já tinham visto.
Depois de vários e inúteis esforços, ventilando com um abanador, usando os mais poderosos e modernos aromatizantes, aspergindo-lhe o rosto com agua fria, chamando-a pelo nome, mandando que piscasse etc etc. Deram-se por vencidos. No entanto perceberam que sua beleza se mantinha, havia uma perfusão adivinhada, uma insuspeitada oxigenação ainda que mínima.
Não tiveram coragem de enterrá-la com tão bela aparência, com tanta beleza preservada.
- Vamos conservá-la numa redoma de cristal no alto daquela colina, cercada de um jardim de lírios e rosas.
E assim fizeram.
O pior não aconteceu, porque logo apareceu um príncipe o qual, vendo tão bela criatura naquela redoma, pediu que lhe a dessem para que a tivesse conservada em seu palácio com todo cuidado.
Os anões anuíram. Não sem antes promoverem um rápido conciliábulo entre eles mesmos. No trajeto para o palácio, no caminho tinha uma pedra, uma providencial pedra no caminho provocou tão rude bacada que o corpo foi sacudido e um pedaço de maçã que se alojara na garganta de B. Neve, foi expelido e com as vias aéreas totalmente livres e também livre da ação do veneno, Branca de Neve recobrou a vida.
Totalmente apaixonado e, tendo lhe salvo a vida; o príncipe propôs casamento a Branca de Neve que aceitou emocionada.
O casamento deu-se tempos depois, com uma festa tão linda e grandiosa que ficou na história para sempre. Compareceu à festa, após a cerimônia religiosa, luterana ou católica, não está claro; gentes de toda a redondeza: os anões, o caçador que não matou, serviçais, o velho rei pai de Branca e a Rainha que assistiu comportadamente o matrimônio, despediu-se cumprimentando os noivos polidamente e se retirou denotando visível depressão e, por isso corre o boato de tenha se lançado em um precipício em busca da morte. Esse autor, de coração compreensivo, valorizador de mulheres pós trinta, pós quarenta... pós 50, pós n...; acha que a família acabou por se entender, houve um perdão abrangente e geral dos personagens (acordão) e todos viveram felizes para sempre.
15\03\2017 - Rilmar
[Visto no Brasil Acadêmico]
Comentários