O cirurgião Iain Hutchison trabalha com pessoas que sofreram graves desfigurações faciais. Através do desenvolvimento de técnicas cirúrgicas...
O cirurgião Iain Hutchison trabalha com pessoas que sofreram graves desfigurações faciais. Através do desenvolvimento de técnicas cirúrgicas, ele ajuda estas pessoas a melhorar suas vidas.
ATENÇÃO: contém fortes e perturbadoras imagens médicas e de violência que podem afetar pessoas sensíveis. Não haverá avisos antes das imagens durante o vídeo.
Qual é a importância de nossa face?
Nossa face é imensamente importante pois é a parte externa que todos vêem. Não nos esqueçamos de que ela é uma unidade funcional. Nós temos fortes ossos cranianos que protegem o órgão mais nobre do nosso corpo: o cérebro.
É onde se localizam nossos sentidos, nossos sentidos especiais -- nossa visão, nossa fala, nossa audição, olfato e paladar. E, este osso é salpicado, como vocês podem ver através da transiluminação do crânio, por cavidades, seios, que aquecem e umidificam o ar que inspiramos.
Esta mulher está morrendo lentamente pois um tumor benigno em seus ossos faciais obstruiram completamente sua boca e nariz, de modo que ela não pode respirar ou comer.
Aderidos aos ossos faciais que compõem nossa estrutura facial estão os músculos responsáveis pela nossa expressão facial, nossa linguagem de expressão universal, nosso sistema de sinalização social. E, sobreposto a eles, está o retalho de pele, que é extremamente complexo uma estrutura tridimensional -- com angulações aqui e ali, exibindo áreas tão finas quanto as pálbebras, e tão espessas quanto as bochechas, de diferentes cores.
Mas não nos esqueçamos do cabelo. Olhando a imagem da esquerda -- é meu filho com suas sombrancelhas. Olhem como ele fica estranho sem sombrancelhas. Há uma diferença óbvia. E imaginem se ele tivesse pêlos saindo pelo nariz, pareceria ainda mais estranho.
Dismorfofobia é uma versão extrema do fato de que não nos vemos como os outros nos vêem. É uma contundente verdade que nos enxergamos apenas através de espelhos, e também nos vemos apenas em imagens estáticas que capturam uma pequena fração do tempo que vivemos.
Estas pessoas não precisam de cirurgia, elas precisam de ajuda psiquiátrica. Max cedeu-me gentilmente sua foto. Ele não é portador de dismorfofobia, mas eu utilizarei sua foto para ilustrar o fato de que ele se apresenta como um dismorfofóbico. Em outras palavras, ele é inteiramente normal.
A idade é outro ponto que modifica nossa atitude em relação à nossa aparência. Pois bem, as crianças se julgam, aprendem a se julgar, através do comportamento dos adultos que a rodeiam. Eis aqui um exemplo clássico: Rebbecca tem um angioma benigno crescendo em seu crânio e que obstruiu seu nariz e ainda está dificultando sua visão. Como vocês podem ver, o tumor bloqueia sua visão. Ela também corre o perigo, caso se machuque aqui, de sangrar profusamente. Nossa pesquisa tem mostrado que os pais e parentes próximos destas crianças as adoram. Eles cresceram acostumados com suas faces; elas pensam que são especiais.
[Imagem: www.savingfaces.co.uk]
Na verdade, algumas vezes os pais questionam se estas crianças deveriam remover a lesão. E ocasionalmente eles sofrem intensas reações de tristeza quando a criança que eles aprenderam amar muda tão dramaticamente e eles não as reconhecem mais. Mas outros adultos dizem coisas incrivelmente dolorosas. Eles dizem: "Como vocês ousam sair com esta criança de casa e aterrorizar as pessoas. Vocês não deveriam fazer algo a respeito disto? Por que vocês não removeram isto?" E as outras crianças, movidas pela curiosidade, apalpam as lesões devido -- uma curiosidade natural. E isto obviamente desperta a criança para sua natureza incomum.
Como adolescentes -- lembrem-se dos seus anos de adolescência -- nós passamos por dramáticas e geralmente desproporcionais mudanças em nossa aparência facial. Estamos na luta para encontrar nossa identidade. Ansiamos pela aprovação dos colegas. Assim, nossa aparência facial nos é vital na medida em que tentamos nos projetar para o mundo. Lembre-se apenas daquela espinha que o invalidou por muitos dias. Quanto tempo você gastou no espelho, cada dia, praticando seu olhar sardónico, seu olhar sério, tentando parecer com o Sean Connery, como eu fazia, tentando elevar apenas uma sobrancelha. É uma fase incapacitante.
Escolhi mostrar-lhes este perfil da Sue, pois ele mostra sua mandíbula projetada adiante e também seu lábio inferior protuso. Eu gostaria que todos na platéia protundissem a mandíbula, virem para a pessoa ao seu lado, protundam suas mandíbulas, virem-se para as pessoas próximas a você e olhem para elas -- elas parecem deprimentes. Isto era exatamente o que as pessoas diziam para Sue. Mas ela não era infeliz, de modo algum. Mas as pessoas diziam para ela: "Por que você é tão infeliz?" As pessoas faziam julgamentos errados o tempo todo, sobre o ânimo dela. Professores e colegas a subestimavam, ela era importunada na escola. Então, ela resolveu operar o rosto. Após a cirurgia facial, ela disse: "Agora minha face reflete minha personalidade. As pessoas sabem agora que sou uma entusiasta, que sou uma pessoa feliz." E esta é uma mudança que pode ser alcançada por adolescentes.
Esta é uma mudança real ou ela é fruto da imaginação dos próprios pacientes? Bem, nós estudamos as reações de adolescentes a fotografias de pacientes submetidos a este tipo de cirurgia facial reconstrutora. E o que nós encontramos foi -- nós misturávamos as fotografias de modo que eles não reconhecessem o antes e o depois -- e o que encontramos foi que os pacientes eram reconhecidos como mais atraentes após a cirurgia. Bem, isto não é nenhuma surpresa, mas também pediamos que eles os julgassem em relação à honestidade, inteligência, simpatia, violência. Todos eram percebidos como tendo todos estes atributos em menor extensão do que a média -- mais violentos etc -- antes da cirurgia. Após a operação, eram tidos como mais inteligentes, mais amigáveis, mais honestos, menos violentos -- ainda que não tivéssemos operados seus intelectos ou caráter.
Quando as pessoas envelhecem, elas não necessariamente optam por este tipo de operação. Suas presenças no consultório é conseqüência 'das pedradas e flechadas da enfurecida sorte' (cit. Hamlet). O que acontece a eles é que geralmente sofreram um trauma ou câncer. Eis aqui uma fotografia do Henry duas semanas após a remoção de um tumor maligno de sua hemiface esquerda -- seu osso zigomático, seu maxilar, sua órbita. Aqui, sua aparência é boa. Mas durante os 15 anos seguintes ele foi submetido a outras 14 operações, à medida em que a doença devastava sua face e destruia paulatinamente a reconstrução que eu havia feito. Aprendi muito com o Henry. Henry ensinou-me que você pode continuar trabalhando. Ele trabalhava como advogado. Ele continuou jogando críquete. Ele apreciava a vida ao extremo. E isto, provavelmente, porque ele tinha uma carreira plena, de sucesso e o suporte da família e era apto a conviver socialmente. Ele manteve um calmo desapego. Eu não digo que ele superou isto; ele não superou. Era algo além disto. Ele ignorou. Ele ignorou a desfiguração que ocorria em sua vida e manteve-se alheio a ela. E isto é o que estas pessoas podem fazer.
Henriapi também ilustra bem este fenômeno. Ele é um homem nos seus 20 anos o qual sua primeira viagem para fora da Nigéria foi motivada por um tumor maligno que o levou até a Inglaterra, para ser operado. Foi minha operação mais longa. Durou 23 horas. Realizei-a junto com meu neurocirurgião. Nós removemos todos os ossos de sua hemiface direita -- seu olho, seu nariz, os ossos cranianos adjacentes, a pele facial -- e o reconstruímos com tecidos do dorso. Ele continuo seu trabalho como enfermeiro psiquiátrico. Ele casou-se. Ele teve um filho chamado Jeremiah. E novamente, ele disse: "Esta pintura minha e do meu filho Jeremiah retrata o homem de sucesso que sinto que sou." Sua desfiguração facial não o afetou porque ele tinha o apoio de uma família, ele tinha um trabalho pleno e de sucesso.
Enfim, vimos que podemos mudar as faces das pessoas. Mas quando mudamos a face de uma pessoa, estamos mudando sua identidade, para melhor ou para pior? Por exemplo, existem dois tipos diferentes de cirurgia facial. Podemos categorizá-las assim. Podemos dizer que existem pacientes que escolhem fazer uma cirurgia facial -- como a Sue. (Que) quando são operados, eles sentem que suas vidas mudam, porque as outras pessoas passam a percebê-las como pessoas melhores. Eles não se sentem diferentes. Eles sentem que, na verdade, ganharam aquilo que nunca tiveram, que sua face agora reflete sua personalidade. E, na verdade, esta é provavelmente a diferença entre a cirurgia estética e este tipo de cirurgia (reconstrutora). Agora você pode dizer: "Bem, este tipo de cirurgia pode ser classificada como estética." Quando você faz cirurgia estética, os pacientes são geralmente menos felizes. Eles estão tentando alcançar a diferença de suas vidas. Sue não estava tentando isto, ela estava apenas tentando ter uma face que se encaixava em sua personalidade.
Por outro lado, temos outras pessoas que não escolhem fazer uma cirurgia facial. Existem pessoas que têm suas faces arrancadas. Eu passarei isto rápido, e temos um slide em branco para os mais sensíveis entre vocês. Eles tiveram isto forçado, sobre eles. E novamente, como disse a vocês, se eles têm uma família como apoio e um bom trabalho na vida, eles podem levar uma vida plena e normal. Suas identidades não mudam.
Esta coisa sobre a aparência e preocupação com ela é um fenômeno ocidental? A família de Muzetta esclarece isto. Esta é um garota de Bangladesh que morava no extremo leste de Londres e que desenvolveu um grande tumor maligno no lado direito de sua face, que quase a cegou, e que crescia tão rapidamente que iria matá-la em pouco tempo. Após a cirurgia de remoção do tumor, seus pais a vestiram com seu lindo vestido de veludo verde, um laço rosa no cabelo, e eles queriam que esta pintura fosse mostrada mundo afora, a despeito do fato de serem muçulmanos ortodoxos e da mãe usar uma burca completa. Enfim, não é um fenômeno simplesmente ocidental.
O.J. Simpson [Wikimedia]
Nós emitimos juízo sobre os rostos das pessoas o tempo todo. Tem sido assim desde que conhecemos Lombroso e seu modo de caracterizar faces criminosas. Ele dizia que você poderia identificar rostos criminosos, julgando-os apenas pelas fotografias que eram mostradas. Pessoas bonitas são sempre julgadas como mais amigáveis.
Agora, sabemos que ele é um convicto espancador de esposas e, na verdade, não é um cara legal. Beleza não equivale a bondade, e certamente não equivale à felicidade.
Pois bem, nós falamos sobre a face estática e o julgamento da face estática, mas, na verdade, ficamos mais confortáveis com julgamentos da face em movimento.
Jurados do sistema de justiça britânico gostam de ver a testemunha ao vivo para ver se conseguem surpreender sinais de falsidade -- o piscar, a hesitação. Portanto eles querem ver as testemunhas ao vivo. Todorov nos diz que, em um décimo de segundo, nós podemos fazer o julgamento sobre o rosto de alguém. Nós nos sentimos desconfortáveis frente a esta imagem? Sim nos sentimos. Nós ficaríamos felizes se a face do nosso médico, ou advogado, ou do nosso consultor financeiro estivesse coberta? Ficaríamos muito pertubados. Mas somos realmente bons em julgar a aparência facial e movimento? A verdade é que existe a 'regra dos cinco minutos' -- não a regra do décimo de segundo de Todorov, mas uma regra de cinco minutos. Se você passa cinco minutos com alguém, você começa a olhar além da aparência facial e pessoas pelas quais inicialmente você foi atraída podem parecer chatas e você perde o interesse por elas e pessoas que inicialmente você não buscaria, porque você não as achou particularmente atraentes, tornam-se pessoas atraentes por causa de suas personalidades.
Pois bem, nós conversamos muito sobre a aparência facial. Eu agora gostaria de compartilhar um pouco da cirurgia que fazemos -- onde estamos e para aonde vamos. Esta é uma imagem da Ann que teve removidas sua mandíbula direita e base do crânio. E vocês podem ver nas imagens seguintes, que nós a reconstruímos com sucesso. Mas não era o suficiente. Isto era o que Ann queria. Ela queria sair com seu caiaque, ela queria sair e subir montanhas. E foi isto que ela conseguiu, e é isto que nós temos que buscar.
Esta é uma imagem horrível, por isso, levanto meu dedo agora. Esta é uma foto do Adi, um gerente de banco que teve seu rosto alvejado por um tiro em um assalto a mão armada. E ele perdeu sua mandíbula, seus lábios, seu queixo e seu maxilar e os dentes. Este foi o parâmetro que ele nos deu: "Eu quero ficar assim. Era assim que eu era antes."
Então, com a tecnologia atual, usamos computadores para fazer os modelos. Nós fizemos um modelo de mandíbula, sem os ossos. Depois nós dobramos uma prótese nele. Colocamos no lugar então, sabíamos que estava na posição correta. A seguir, nós implantamos ossos e tecidos retirados do dorso. Aqui vocês podem ver a prótese sustentando tudo, e vocês podem ver os implantes inseridos -- isso tudo em uma única operação. Nós obtivemos isto e isto. Então, a vida do paciente foi restaurada. Esta é a boa notícia.
Contudo, a pele do seu queixo não se parece com a mesma de antes. Ela é a pele do seu dorso. Ela é mais espessa, mais escura, mais áspera, não exibe os mesmos contornos. E é aqui que falhamos. E é aqui onde nós precisamos do transplante de face.
Nós podemos substituir as estruturas mais profundas, mas ainda não somos bons em substituir a pele facial. Então, é muito valioso termos semelhante ferramenta em nosso arsenal. Mas os pacientes terão que tomar remédios para suprimir seus sistemas imunes, pelo resto de suas vidas. O que isto significa? Eles terão um risco aumentado de infecções e tumores malignos. Isto não é um transplante para salvar vidas -- como os transplantes cardíacos ou hepáticos ou pulmonares -- isto é um transplante para melhorar a qualidade de vida, e como resultado, os pacientes poderão dizer, caso desenvolvam um tumor maligno 10 a 15 anos depois: "Eu gostaria de ter feito uma técnica reconstrutora convencional, ao invés disto, pois agora, eu estou morrendo de um tumor maligno?" Nós ainda não sabemos. Nós também não sabemos o que eles sentem em relação à identidade e reconhecimento. Bernard Devauchelle e Sylvie Testelin que fizeram a primeira operação estão estudando isto. Doadores serão escassos, pois quantas pessoas desejarão ter a face de seus amados removidas no momento da morte? Ou seja, existirão problemas com o transplante de face.
Mas a boa notícia é que o futuro está quase aqui -- é o futuro é a engenharia tecidual. Imaginem apenas, Eu posso fazer um molde biodegradável. Eu posso colocá-lo no local em que ele deveria ficar. Eu posso salpicar algumas poucas células, células-tronco retiradas do quadril do próprio paciente, mais um pouquinho de proteínas geneticamente manipuladas, e mais um pouco, esperar uns quatro meses e a face está regenerada. É mais ou menos como uma receita da Julia Child.
Mas nós ainda temos problemas. Temos o câncer de boca para resolver. Nós ainda não curamos pacientes o suficiente -- é o tipo de câncer mais desfigurador. Nós ainda não o reconstruímos bem o suficiente. No Reino Unido temos uma epidemia de traumas faciais entre jovens. Nós ainda não nos livramos das cicatrizes. Nós precisamos fazer pesquisas. E a melhor notícia de todas é que os cirurgiões sabem que nós precisamos pesquisar. E nós organizamos um fundo de caridade que nos ajudará levantar recursos para a pesquisa clínica para determinar qual a melhor técnica terapêutica, atualmente e o melhor tratamento para o futuro, ou seja, nós simplesmente não nos assentamos sobre nossos títulos e dizemos: "Ok, nós estamos fazendo o correto. Deixemos como está."
Meu muito obrigado a vocês.
Saiba mais:
Pele em spray para vítimas de queimadura.
Fundação Saving Faces - www.savingfaces.co.uk
[Via BBA]
ATENÇÃO: contém fortes e perturbadoras imagens médicas e de violência que podem afetar pessoas sensíveis. Não haverá avisos antes das imagens durante o vídeo.
Qual é a importância de nossa face?
Nossa face é imensamente importante pois é a parte externa que todos vêem. Não nos esqueçamos de que ela é uma unidade funcional. Nós temos fortes ossos cranianos que protegem o órgão mais nobre do nosso corpo: o cérebro.
É onde se localizam nossos sentidos, nossos sentidos especiais -- nossa visão, nossa fala, nossa audição, olfato e paladar. E, este osso é salpicado, como vocês podem ver através da transiluminação do crânio, por cavidades, seios, que aquecem e umidificam o ar que inspiramos.
Agora imaginem, se fossem ossos sólidos, nossa cabeça seria tão pesada que não conseguiríamos mantê-la erguida, não seríamos capazes de olhar o mundo ao nosso redor.
Esta mulher está morrendo lentamente pois um tumor benigno em seus ossos faciais obstruiram completamente sua boca e nariz, de modo que ela não pode respirar ou comer.
Aderidos aos ossos faciais que compõem nossa estrutura facial estão os músculos responsáveis pela nossa expressão facial, nossa linguagem de expressão universal, nosso sistema de sinalização social. E, sobreposto a eles, está o retalho de pele, que é extremamente complexo uma estrutura tridimensional -- com angulações aqui e ali, exibindo áreas tão finas quanto as pálbebras, e tão espessas quanto as bochechas, de diferentes cores.
E temos ainda o fator sensual da face. Onde gostamos de beijar as pessoas? Nos lábios. Mordiscar as orelhas, talvez. É pela face que nos atraímos.
Mas não nos esqueçamos do cabelo. Olhando a imagem da esquerda -- é meu filho com suas sombrancelhas. Olhem como ele fica estranho sem sombrancelhas. Há uma diferença óbvia. E imaginem se ele tivesse pêlos saindo pelo nariz, pareceria ainda mais estranho.
Dismorfofobia é uma versão extrema do fato de que não nos vemos como os outros nos vêem. É uma contundente verdade que nos enxergamos apenas através de espelhos, e também nos vemos apenas em imagens estáticas que capturam uma pequena fração do tempo que vivemos.
Dismorfofobia é um distúrbio disto, no qual pessoas que podem ser extremamente belas se enxergam como horrorosas e estão constantemente procurando cirurgias para corrigir sua aparência facial.
Estas pessoas não precisam de cirurgia, elas precisam de ajuda psiquiátrica. Max cedeu-me gentilmente sua foto. Ele não é portador de dismorfofobia, mas eu utilizarei sua foto para ilustrar o fato de que ele se apresenta como um dismorfofóbico. Em outras palavras, ele é inteiramente normal.
A idade é outro ponto que modifica nossa atitude em relação à nossa aparência. Pois bem, as crianças se julgam, aprendem a se julgar, através do comportamento dos adultos que a rodeiam. Eis aqui um exemplo clássico: Rebbecca tem um angioma benigno crescendo em seu crânio e que obstruiu seu nariz e ainda está dificultando sua visão. Como vocês podem ver, o tumor bloqueia sua visão. Ela também corre o perigo, caso se machuque aqui, de sangrar profusamente. Nossa pesquisa tem mostrado que os pais e parentes próximos destas crianças as adoram. Eles cresceram acostumados com suas faces; elas pensam que são especiais.
Na verdade, algumas vezes os pais questionam se estas crianças deveriam remover a lesão. E ocasionalmente eles sofrem intensas reações de tristeza quando a criança que eles aprenderam amar muda tão dramaticamente e eles não as reconhecem mais. Mas outros adultos dizem coisas incrivelmente dolorosas. Eles dizem: "Como vocês ousam sair com esta criança de casa e aterrorizar as pessoas. Vocês não deveriam fazer algo a respeito disto? Por que vocês não removeram isto?" E as outras crianças, movidas pela curiosidade, apalpam as lesões devido -- uma curiosidade natural. E isto obviamente desperta a criança para sua natureza incomum.
Após a cirurgia, tudo se normaliza. Os adultos se comportam mais naturalmente e as crianças brincam mais prontamente com as outras crianças.
Como adolescentes -- lembrem-se dos seus anos de adolescência -- nós passamos por dramáticas e geralmente desproporcionais mudanças em nossa aparência facial. Estamos na luta para encontrar nossa identidade. Ansiamos pela aprovação dos colegas. Assim, nossa aparência facial nos é vital na medida em que tentamos nos projetar para o mundo. Lembre-se apenas daquela espinha que o invalidou por muitos dias. Quanto tempo você gastou no espelho, cada dia, praticando seu olhar sardónico, seu olhar sério, tentando parecer com o Sean Connery, como eu fazia, tentando elevar apenas uma sobrancelha. É uma fase incapacitante.
Escolhi mostrar-lhes este perfil da Sue, pois ele mostra sua mandíbula projetada adiante e também seu lábio inferior protuso. Eu gostaria que todos na platéia protundissem a mandíbula, virem para a pessoa ao seu lado, protundam suas mandíbulas, virem-se para as pessoas próximas a você e olhem para elas -- elas parecem deprimentes. Isto era exatamente o que as pessoas diziam para Sue. Mas ela não era infeliz, de modo algum. Mas as pessoas diziam para ela: "Por que você é tão infeliz?" As pessoas faziam julgamentos errados o tempo todo, sobre o ânimo dela. Professores e colegas a subestimavam, ela era importunada na escola. Então, ela resolveu operar o rosto. Após a cirurgia facial, ela disse: "Agora minha face reflete minha personalidade. As pessoas sabem agora que sou uma entusiasta, que sou uma pessoa feliz." E esta é uma mudança que pode ser alcançada por adolescentes.
Esta é uma mudança real ou ela é fruto da imaginação dos próprios pacientes? Bem, nós estudamos as reações de adolescentes a fotografias de pacientes submetidos a este tipo de cirurgia facial reconstrutora. E o que nós encontramos foi -- nós misturávamos as fotografias de modo que eles não reconhecessem o antes e o depois -- e o que encontramos foi que os pacientes eram reconhecidos como mais atraentes após a cirurgia. Bem, isto não é nenhuma surpresa, mas também pediamos que eles os julgassem em relação à honestidade, inteligência, simpatia, violência. Todos eram percebidos como tendo todos estes atributos em menor extensão do que a média -- mais violentos etc -- antes da cirurgia. Após a operação, eram tidos como mais inteligentes, mais amigáveis, mais honestos, menos violentos -- ainda que não tivéssemos operados seus intelectos ou caráter.
Quando as pessoas envelhecem, elas não necessariamente optam por este tipo de operação. Suas presenças no consultório é conseqüência 'das pedradas e flechadas da enfurecida sorte' (cit. Hamlet). O que acontece a eles é que geralmente sofreram um trauma ou câncer. Eis aqui uma fotografia do Henry duas semanas após a remoção de um tumor maligno de sua hemiface esquerda -- seu osso zigomático, seu maxilar, sua órbita. Aqui, sua aparência é boa. Mas durante os 15 anos seguintes ele foi submetido a outras 14 operações, à medida em que a doença devastava sua face e destruia paulatinamente a reconstrução que eu havia feito. Aprendi muito com o Henry. Henry ensinou-me que você pode continuar trabalhando. Ele trabalhava como advogado. Ele continuou jogando críquete. Ele apreciava a vida ao extremo. E isto, provavelmente, porque ele tinha uma carreira plena, de sucesso e o suporte da família e era apto a conviver socialmente. Ele manteve um calmo desapego. Eu não digo que ele superou isto; ele não superou. Era algo além disto. Ele ignorou. Ele ignorou a desfiguração que ocorria em sua vida e manteve-se alheio a ela. E isto é o que estas pessoas podem fazer.
Henriapi também ilustra bem este fenômeno. Ele é um homem nos seus 20 anos o qual sua primeira viagem para fora da Nigéria foi motivada por um tumor maligno que o levou até a Inglaterra, para ser operado. Foi minha operação mais longa. Durou 23 horas. Realizei-a junto com meu neurocirurgião. Nós removemos todos os ossos de sua hemiface direita -- seu olho, seu nariz, os ossos cranianos adjacentes, a pele facial -- e o reconstruímos com tecidos do dorso. Ele continuo seu trabalho como enfermeiro psiquiátrico. Ele casou-se. Ele teve um filho chamado Jeremiah. E novamente, ele disse: "Esta pintura minha e do meu filho Jeremiah retrata o homem de sucesso que sinto que sou." Sua desfiguração facial não o afetou porque ele tinha o apoio de uma família, ele tinha um trabalho pleno e de sucesso.
Enfim, vimos que podemos mudar as faces das pessoas. Mas quando mudamos a face de uma pessoa, estamos mudando sua identidade, para melhor ou para pior? Por exemplo, existem dois tipos diferentes de cirurgia facial. Podemos categorizá-las assim. Podemos dizer que existem pacientes que escolhem fazer uma cirurgia facial -- como a Sue. (Que) quando são operados, eles sentem que suas vidas mudam, porque as outras pessoas passam a percebê-las como pessoas melhores. Eles não se sentem diferentes. Eles sentem que, na verdade, ganharam aquilo que nunca tiveram, que sua face agora reflete sua personalidade. E, na verdade, esta é provavelmente a diferença entre a cirurgia estética e este tipo de cirurgia (reconstrutora). Agora você pode dizer: "Bem, este tipo de cirurgia pode ser classificada como estética." Quando você faz cirurgia estética, os pacientes são geralmente menos felizes. Eles estão tentando alcançar a diferença de suas vidas. Sue não estava tentando isto, ela estava apenas tentando ter uma face que se encaixava em sua personalidade.
Por outro lado, temos outras pessoas que não escolhem fazer uma cirurgia facial. Existem pessoas que têm suas faces arrancadas. Eu passarei isto rápido, e temos um slide em branco para os mais sensíveis entre vocês. Eles tiveram isto forçado, sobre eles. E novamente, como disse a vocês, se eles têm uma família como apoio e um bom trabalho na vida, eles podem levar uma vida plena e normal. Suas identidades não mudam.
Esta coisa sobre a aparência e preocupação com ela é um fenômeno ocidental? A família de Muzetta esclarece isto. Esta é um garota de Bangladesh que morava no extremo leste de Londres e que desenvolveu um grande tumor maligno no lado direito de sua face, que quase a cegou, e que crescia tão rapidamente que iria matá-la em pouco tempo. Após a cirurgia de remoção do tumor, seus pais a vestiram com seu lindo vestido de veludo verde, um laço rosa no cabelo, e eles queriam que esta pintura fosse mostrada mundo afora, a despeito do fato de serem muçulmanos ortodoxos e da mãe usar uma burca completa. Enfim, não é um fenômeno simplesmente ocidental.
Nós emitimos juízo sobre os rostos das pessoas o tempo todo. Tem sido assim desde que conhecemos Lombroso e seu modo de caracterizar faces criminosas. Ele dizia que você poderia identificar rostos criminosos, julgando-os apenas pelas fotografias que eram mostradas. Pessoas bonitas são sempre julgadas como mais amigáveis.
Nós olhamos para o O.J. (Simpson) - ele é um cara bonito. Nós gostaríamos de passar algum tempo com ele. Ele aparenta ser amigável.
Agora, sabemos que ele é um convicto espancador de esposas e, na verdade, não é um cara legal. Beleza não equivale a bondade, e certamente não equivale à felicidade.
Pois bem, nós falamos sobre a face estática e o julgamento da face estática, mas, na verdade, ficamos mais confortáveis com julgamentos da face em movimento.
Nós pensamos que podemos julgar as pessoas pelas suas expressões faciais.
Jurados do sistema de justiça britânico gostam de ver a testemunha ao vivo para ver se conseguem surpreender sinais de falsidade -- o piscar, a hesitação. Portanto eles querem ver as testemunhas ao vivo. Todorov nos diz que, em um décimo de segundo, nós podemos fazer o julgamento sobre o rosto de alguém. Nós nos sentimos desconfortáveis frente a esta imagem? Sim nos sentimos. Nós ficaríamos felizes se a face do nosso médico, ou advogado, ou do nosso consultor financeiro estivesse coberta? Ficaríamos muito pertubados. Mas somos realmente bons em julgar a aparência facial e movimento? A verdade é que existe a 'regra dos cinco minutos' -- não a regra do décimo de segundo de Todorov, mas uma regra de cinco minutos. Se você passa cinco minutos com alguém, você começa a olhar além da aparência facial e pessoas pelas quais inicialmente você foi atraída podem parecer chatas e você perde o interesse por elas e pessoas que inicialmente você não buscaria, porque você não as achou particularmente atraentes, tornam-se pessoas atraentes por causa de suas personalidades.
Se você passa cinco minutos com alguém, você começa a olhar além da aparência facial
Pois bem, nós conversamos muito sobre a aparência facial. Eu agora gostaria de compartilhar um pouco da cirurgia que fazemos -- onde estamos e para aonde vamos. Esta é uma imagem da Ann que teve removidas sua mandíbula direita e base do crânio. E vocês podem ver nas imagens seguintes, que nós a reconstruímos com sucesso. Mas não era o suficiente. Isto era o que Ann queria. Ela queria sair com seu caiaque, ela queria sair e subir montanhas. E foi isto que ela conseguiu, e é isto que nós temos que buscar.
Esta é uma imagem horrível, por isso, levanto meu dedo agora. Esta é uma foto do Adi, um gerente de banco que teve seu rosto alvejado por um tiro em um assalto a mão armada. E ele perdeu sua mandíbula, seus lábios, seu queixo e seu maxilar e os dentes. Este foi o parâmetro que ele nos deu: "Eu quero ficar assim. Era assim que eu era antes."
Então, com a tecnologia atual, usamos computadores para fazer os modelos. Nós fizemos um modelo de mandíbula, sem os ossos. Depois nós dobramos uma prótese nele. Colocamos no lugar então, sabíamos que estava na posição correta. A seguir, nós implantamos ossos e tecidos retirados do dorso. Aqui vocês podem ver a prótese sustentando tudo, e vocês podem ver os implantes inseridos -- isso tudo em uma única operação. Nós obtivemos isto e isto. Então, a vida do paciente foi restaurada. Esta é a boa notícia.
Contudo, a pele do seu queixo não se parece com a mesma de antes. Ela é a pele do seu dorso. Ela é mais espessa, mais escura, mais áspera, não exibe os mesmos contornos. E é aqui que falhamos. E é aqui onde nós precisamos do transplante de face.
O transplante facial tem seu papel provavelmente em pacientes queimados para a reposição da pele.
Nós podemos substituir as estruturas mais profundas, mas ainda não somos bons em substituir a pele facial. Então, é muito valioso termos semelhante ferramenta em nosso arsenal. Mas os pacientes terão que tomar remédios para suprimir seus sistemas imunes, pelo resto de suas vidas. O que isto significa? Eles terão um risco aumentado de infecções e tumores malignos. Isto não é um transplante para salvar vidas -- como os transplantes cardíacos ou hepáticos ou pulmonares -- isto é um transplante para melhorar a qualidade de vida, e como resultado, os pacientes poderão dizer, caso desenvolvam um tumor maligno 10 a 15 anos depois: "Eu gostaria de ter feito uma técnica reconstrutora convencional, ao invés disto, pois agora, eu estou morrendo de um tumor maligno?" Nós ainda não sabemos. Nós também não sabemos o que eles sentem em relação à identidade e reconhecimento. Bernard Devauchelle e Sylvie Testelin que fizeram a primeira operação estão estudando isto. Doadores serão escassos, pois quantas pessoas desejarão ter a face de seus amados removidas no momento da morte? Ou seja, existirão problemas com o transplante de face.
Mas a boa notícia é que o futuro está quase aqui -- é o futuro é a engenharia tecidual. Imaginem apenas, Eu posso fazer um molde biodegradável. Eu posso colocá-lo no local em que ele deveria ficar. Eu posso salpicar algumas poucas células, células-tronco retiradas do quadril do próprio paciente, mais um pouquinho de proteínas geneticamente manipuladas, e mais um pouco, esperar uns quatro meses e a face está regenerada. É mais ou menos como uma receita da Julia Child.
Mas nós ainda temos problemas. Temos o câncer de boca para resolver. Nós ainda não curamos pacientes o suficiente -- é o tipo de câncer mais desfigurador. Nós ainda não o reconstruímos bem o suficiente. No Reino Unido temos uma epidemia de traumas faciais entre jovens. Nós ainda não nos livramos das cicatrizes. Nós precisamos fazer pesquisas. E a melhor notícia de todas é que os cirurgiões sabem que nós precisamos pesquisar. E nós organizamos um fundo de caridade que nos ajudará levantar recursos para a pesquisa clínica para determinar qual a melhor técnica terapêutica, atualmente e o melhor tratamento para o futuro, ou seja, nós simplesmente não nos assentamos sobre nossos títulos e dizemos: "Ok, nós estamos fazendo o correto. Deixemos como está."
Meu muito obrigado a vocês.
Saiba mais:
Pele em spray para vítimas de queimadura.
Fundação Saving Faces - www.savingfaces.co.uk
[Via BBA]
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